segunda-feira, 16 de junho de 2008

Um olhar psicanalítico sobre o Fracasso Escolar

Trabalhando como pedagoga e professora em escolas de ensino fundamental e médio, e como psicopedagoga clínica atendendo crianças e adolescentes, percebo que os distúrbios e/ou dificuldades de aprendizagem muitas vezes ultrapassam os campos do conhecimento pedagógico, neurológico e didático.
Há muito, almejava estudar e escrever sobre este tema...
Hoje, lendo Freud e Melanie Klein apresento uma escuta e um olhar psicanalítico sobre o diagnóstico e sessões psicopedagógicas, na medida que percebo a aprendizagem sentida pelos pacientes, como uma ansiedade paranóide, em vista do perigo representado pelo conhecimento novo, e de ansiedade depressiva, pela perda simultânea de um esquema referencial e de certos vínculos que estariam envolvidos na aprendizagem.
A partir desse pressuposto, o diagnóstico psicopedagógico teria outra conotação, pois, muitas vezes o que nos é apresentado tem uma profundidade muito maior, atrás de uma pseudocamuflagem detectável.
No tratamento psicopedagógico originalmente, investiga o porquê do não-aprender, do aprender com dificuldade ou lentamente, do não-revelar o que aprendeu, do fugir de situações de possível aprendizagem, através do sintoma do aluno.
O sintoma, sempre está dizendo alguma coisa ao outro, sempre se comunica com o outro e sobre ele sempre se pode dizer algo; é, portanto, o que emerge da personalidade em interação com o sistema social em que está inserido o sujeito. O distúrbio de aprendizagem ou fracasso escolar é manifestado na maioria das vezes num ambiente específico (escola, turma ou em relação a um professor) podendo não se manifestar de forma clara em outro contexto escolar.
Assim, torna evidente que há um certo desvio em relação a determinados parâmetros existentes no meio, que são representados por suas exigências.
Mas, desvio em relação a quê?
Aqui está o ponto crucial do diagnóstico e deste trabalho de monografia. É preciso clareza do terapeuta na busca desses parâmetros, que vão definir a qualidade e a quantidade do desvio e sua importância no desenvolvimento da escolaridade.
Esses parâmetros podem ser identificados como: formação cultural, classe socioeconômica, idade cronológica, exigência familiar ou escolar, relação entre conteúdos escolares e desenvolvimento de estruturas de pensamento, a psicogênese da leitura e da escrita, etc.
A psicanálise neste momento nos é muito valiosa vez que, nos atribui outros parâmetros como: conflito edipiano, fases libidinais do aluno, personificação no lúdico, formação de símbolos pelo ego, o desmame, o estado maníaco – depressivo infantil, os mecanismos esquizóides, etc. E o mais importante: a descarga de ansiedade e culpa feita por esses parâmetros na criança, refletida em seu desenvolvimento cognitivo e social.
A teoria psicanalítica, pouco conhecida dos psicopedagogos e educadores, vem para somar, atribuindo novos parâmetros aos sintomas, sendo eficiente no sentido que pode evitar uma má interpretação no diagnóstico e no tratamento de uma criança.



O Diagnóstico
No diagnóstico temos a tarefa de focalizar o desvio, já citado, que de alguma forma está inserido claramente ou disfarçadamente na queixa inicial da família ou da escola. No diagnóstico devemos tomar cuidado, pois, nosso aluno não pode ser visto como uma ilha isolada no tempo e no espaço da realidade em que vive. Também é necessário estabelecer claramente o que a escola deste aluno oferece como ensino e o que exige como produto de aprendizagem.
As construções afetivas e cognitivas do aluno estarão assim afetadas pela ansiedade resultante de seu imaginário no modo com ele se relaciona com os objetivos e situações de aprendizagem.
O diagnóstico também tem a sua função terapêutica na medida que já na entrevista com os pais, leva-os a pensar mais sobre a vida do filho e suas próprias vidas; sobre questões acontecimentos antes irrelevantes e que agora ficam reposicionados.
Um diagnóstico sério e bem feito nos aponta muitas vezes parâmetros que não são pedagógicos ou didáticos, mas sim condutas inconscientes do paciente em relação sua família e com suas representações objetais.
Ainda no diagnóstico, o aluno pode usufruir do mecanismo de transferência quando age inconscientemente pedindo ajuda ou proteção, se mostra dependente ou onipotente.
Podemos seguir uma Seqüência Diagnóstica, sugerida por Maria Lúcia L. Weiss:
1. Entrevista Familiar
2. Entrevista de Anamnese
3. Sessões lúdicas centradas na aprendizagem ou focalizadas na queixa inicial
É necessário lembrar que muitos pacientes não contribuem com sessões diagnósticas formais, então devemos nos apoiar nas sessões de lodoterapia, muito usado por Melain Klein, Winncott e Virginia M. Axline e seus seguidores. Afinal não é necessário que o paciente / criança fique frente à uma mesa para “revelar” seu desvio.


A anamnese é a integração das dimensões do passado, presente e futuro do paciente, é na verdade, uma anamnese de toda a família. Ela mostra os preconceitos, normas, expectativas, a circulação de afetos e conhecimentos da estrutura familiar, além do peso das gerações anteriores que é depositado no paciente.
Devemos avaliar quem são as pessoas que participam da anamnese. Os pais? Somente a mãe? Somente o pai? Somente a avó? No caso de pais separados, eles participam da anamnese do filho, juntos, separados ou acompanhados de seus novos companheiros. Muito importante é a neutralidade do terapeuta, não fazendo nenhuma aliança com nenhum deles, nem deixar que o ausente seja o “bode expiatório” da situação.
Na anamnese todos os familiares da criança devem sentir liberdade de expor seus pensamentos e sentimentos sobre a criança para que possam compreender os pontos nevrálgicos.
A anamnese, já é em si uma intervenção na dinâmica familiar em relação à criança. O mínimo se processa uma reflexão dos pais, um mergulho no passado, buscando o inicio da vida do paciente, o que inclui espontaneamente uma volta à própria vida da família como um todo. É um momento de extensa horizontalidade ao longo a penetração na verticalidade de cada pergunta que não deve limitar-se do “quando”, mas aprofundar-se no “como”.
Também é importante e produtivo que os pais, ao fazerem o relato das aquisições, progressos e atrasos do paciente, estabelecem comparações com os irmãos no sentido de ficar claro o que aconteceria com ele, como estavam os irmãos nesse momento, como estava a família (material e emocionalmente, o que de fato acontecia).


Modelo de Anamnese:

Nome:_________________________________________________
1) COMPOSIÇÃO FAMILIAR:
ü Lista dos irmãos com respectivas idades e situação escolar (incluir abortos ou mortos)

ü Outras pessoas na família – funções e papéis

2) DESENVOLVIMENTO:
ü Como foi a gestação, o parto, o nascimento?

ü Primeiras reações da criança após o nascimento:

ü Reações dos familiares à criança recém-nascida:

ü Sono: como foi, como é?

ü Alimentação: como foi, como é ?

ü Alguma dificuldade motora foi observada pela família em alguma época de seu desenvolvimento? Qual, quando e como lidaram com tal dificuldade:

ü Quando ficou em pé sozinho?

ü Quando andou?

ü Quando falou as primeiras palavras?

ü Falou errado, ainda fala, como?

ü Gaguejou? Quando?

ü Quando aprendeu o controle dos esfíncteres?

ü Fezes durante o dia:

ü Urina durante o dia:

ü Urina à noite:

3) MANIPULAÇÕES:
ü Chupeta chupa dedo, roe unha, puxa orelha, morde lábios, tiques, etc.?

ü Reação dos familiares a estas manipulações:
4) SOCIALIZAÇÃO
ü Descrição do contato com companheiros e adultos:

5) DOENÇAS:
ü Descrição de doenças, convulsões, desmaios, cirurgias, época e reação da família:


ü Comprometimento na visão ou audição? Já fez alguma consulta médica nessa área? Quando, resultados:


ü Comprometimento neurológico? Já consultou algum profissional, quando, resultados:

6) HISTÓRIA ESCOLAR:
ü Adaptou-se bem à escola?

ü Cite as escolas que a criança freqüentou, discriminando as séries que cursou em cada uma delas. Porque mudou de escola?

ü Quando foi alfabetizado? (com 6 ou 7 anos)


ü Já freqüentou aula particular ou ainda freqüenta?

ü Gosta de estudar?

ü Precisa de ajuda em casa?

ü Quer ser o primeiro aluno?

ü Gosta da professora?

ü Você percebe que a criança tem alguma dificuldade em matemática, leitura, escrita? Descrever:

ü É irrequieto, disperso?

ü É destro, canhoto ou ambidestro?

ü Foi reprovado alguma vez? Quando? Qual a atitude dos familiares?

ü A escola atual tem alguma queixa? Descrever:


ü Qual a impressão de cada pai a respeito da escola atual?
7) ANTECEDENTES FAMILIARES:
ü Relate casos de doença mental, retardo mental, alcoolismo, uso de drogas, doença neurológica, etc – considerar pais, avós, tios, primos, de ambos os lados.

ü Alguém com dificuldades de aprendizagem?

8) AMBIENTE FAMILIAR E SOCIAL:
ü Qual o tipo de residência; há lugar para estudar e para brincar?

ü A criança tem “hora” para estudar/ brincar / fazer dever de casa?

ü Quais são as regras estabelecidas no convívio da família?

ü Os pais vivem juntos? Já houve separação? Em caso afirmativo, em que época ocorreu, qual a idade dos filhos na época, como reagiram, e com quem vivem os filhos atualmente:

ü Descreva o relacionamento entre os pais:

ü Descreva o relacionamento da criança com cada pai:

ü Como é o relacionamento com os irmãos?

ü Religião dos pais e a criança:

ü Contatos sociais da família:

ü Como passam os fins de semana:

ü Descrever um dia completo da criança:

ü Com relação à dificuldade apresentada pela criança, o que faz cada membro da família (colabora, culpabiliza, agrava, complica, simplifica)

ü Na sua opinião, qual seria o papel de cada um dos membros da família, na resolução da dificuldade apresentada pela criança?


A resistência dos Pais
Devemos prestar muita atenção como os pais e demais familiares encaram o processo terapêutico da criança. Para muitas famílias, a situação terapêutica apresenta ameaça no sentido do diagnóstico do aluno espelhar os sintomas dos adultos.
Ainda sobre os pais, é muito comum visualizar a disputa de poder entre o casal quando um genitor aceita o tratamento e o outro discorda; ou o “papel” desenvolvido por eles como o da mãe sofredora que cuida dos filhos, da mãe vítima e abandonada. Onde pode ser percebido a carga de ansiedade e culpa dos pais sobre a criança em questão.
Até a queixa inicial pode estar camuflada, “escondendo” um motivo latente da família. A queixa pode estar inserida no contexto cognitivo camuflando um sintoma enraizado nas relações objetais ou numa fase específica do desenvolvimento psíquico. Sendo fundamental a reflexão sobre o sujeito e a família ainda na explicitação da queixa; para se definir a seqüência diagnóstica e o caminho terapêutico a percorrer.
Já no primeiro encontro com os pais, podemos usar a ansiedade como um instrumento a nosso favor. Com bom senso, usamos a ansiedade dos pais para construir o rapport, lembrando que sem confiança dos pais e da criança não chegaremos a lugar algum.
Com o rapport estabelecido há uma livre circulação de sentimentos e informações, onde podemos observar várias questões como: o diálogo entre pais e a criança, o nível de ligação entre o casal, se há fantasias de saúde ou doença na família, “o significado” do sistema para a família e na família, etc.
Devemos considerar ainda que os pais só transmitem o que querem ou “podem” e o terapeuta fica limitado inicialmente a esses dados.


O consultório
É importante que o consultório apresente um lugar agradável tanto para as crianças (no colorido, nos brinquedos e jogos,etc), tanto para os adolescentes ( que precisa se sentir ouvido, respeitado, no mesmo nível que os pais).
O consultório e o terapeuta (assim como na análise de adultos) não podem reproduzir o contexto e a autoridade familiar e escolar.
A aparência do consultório é fundamental na criação de um clima espontâneo de trabalho, no despertar o desejo de conhecer. Não deverá ser uma réplica da sala de visita do lar, onde o paciente possa discriminar esse local dos demais que freqüenta, para trilhar de forma prazerosa, diferentes caminhos e novas condutas.
Para Winnicot (1978), é um “espaço em potencial” onde as vivências nele, com características específicas, auxiliam o paciente na total liberdade de agir, dramatizando situações que o constrangem.
É interessante que o consultório para atendimento de crianças e adolescentes, tenha além de jogos e brinquedos, um relógio e um calendário, pois, a necessidade de interiorizar o domínio do tempo, suas divisões, sua seqüência com a qual se vive a realidade do dia-a-dia. Afinal, o tempo e o espaço são variáveis que possibilitam a construção de limites no mundo interno e externo.
Os desencontros no uso do tempo entre o paciente e seus familiares, professores e colegas geram grande ansiedade e angústia.
O trabalho terapêutico busca a interiorização do tempo, em suas diferentes dimensões, e possibilita a construção do sentimento de continuidade que foi interrompido em algumas crianças.
Winnicott (1970) nos chama a atenção para os processos facilitadores do ambiente em relação à manutenção, que possibilitam a

Continuidade na transmissão da capacidade de ser, como indivíduo de geração para geração. Da capacidade de ser surge a capacidade de fazer – de gerar como indivíduo (...) de criar e recriar o ambiente cultural.
Sendo o consultório para terapia infantil (seja o desvio de fundo psíquico ou cognitivo), uma das constantes do tratamento, deve permanecer o mais imutável possível. Deve-se evitar a troca de sala, mudanças de mobiliários e demais objetos, pois, a constância do espaço terapêutico, com todos os seus elementos, é estuturante para o paciente, principalmente para aquele que passou por sucessivas trocas ou abandono de qualquer espécie ou significado para ele.
Os referenciais de tempo e espaço são constantes no enquadramento terapêutico, sendo referenciais para todo ser humano e por isso é necessário que o paciente saiba de antemão as mudanças que serão feitas no consultório.



Vamos Brincar?
Nas sessões com crianças, principalmente, menores de 08 anos de idade, devemos estabelecer uma prática terapêutica através do ato de brincar, essencial para “estabelecer confiança”, Winnicott (1975). Onde a própria criança pode construir a sessão de forma espontânea, permitindo-nos observar seus conhecimentos, atitudes, destrezas, mecanismos de defesa e ansiedade.
Nosso olhar psicanalítico atua e diferencia o processo terapêutico no sentido que espreita a temática do ato de brincar da criança quando envolve o significado do conteúdo das atividades no aspecto manifesto e latente, e a dinâmica, através da postura e linguagem corporal, através do não dito.
O brincar no processo terapêutico permite a criança brincar, jogar, representar e dramatizar suas condutas infantis.
A técnica do jogo em psicanálise foi elaborada por Melanie Klein, Anna Freud, Lowenfeld e outros que aprofundaram o simbolismo inconsciente do jogo.
O lúdico permite a criança construir um espaço de experimentação, de transição entre o mundo interno e o externo; espaço transacional: criança – outro, indivíduo – meio.
Winnicott nos possibilita uma melhor compreensão:
É no brincar, e somente no brincar, que o indivíduo, a criança ou o adulto, pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral: e é somente sendo criativo que o indivíduo descobre o eu (self). (1975, p. 80)
A psicoterapia se efetua na sobreposição de duas áreas do brincar, a do paciente e a do terapeuta. A psicoterapia trata de duas pessoas que brincam juntas. (1975 p. 59).

O terapeuta pontua em uma sessão lúdica quando questiona a aceitação ou não de situações imaginárias, a resistência às frustrações e a elaboração de desafios e mudanças na brincadeira que correspondem ao mecanismo de transferência.
Melanie Klein nos mostra em toda sua obra que os personagens ou personificações nos jogos das crianças se originam de imagos internas através da cisão e da projeção, que surgem como uma defesa contra a ansiedade. E que o superego está em constate modificação na transformação psíquica da criança, uma contribuição muito valiosa para os educadores em geral, no sentido de esclarecer e contribuir para o entendimento do fracasso escolar.
O jogo e a brincadeira na teoria psicanalítica tem a função de descarga para as fantasias infantis; sendo o mesmo mecanismo usado na elaboração do sonho para os adultos, na importância da realização de desejos na atividade menta.
Brincar é, portanto, um mecanismo psíquico na realização de desejos pertencentes ao id. A criança que não corresponde ao processo de aprendizagem escolar muitas vezes não o faz, porque está “ocupada demais” em resolver ou desenvolver suas questões psíquicas como neurose obsessiva, paranóica e instintos psicóticos na medida que internaliza ou não as regras do superego.
Muitas crianças apresentam traços paranóicos quando ao brincar ou jogar com demais crianças sentem constantemente espionadas, como se outros adivinhassem seus pensamentos. Em outros momentos, projeta para si o instinto perseguidor quando atormenta seus coleginhas. Esse mecanismo pode ser visto claramente no meio escolar, quando a criança vê o professor como uma ameaça constante, como um inimigo aliado de seus pais (superego) e nega o conhecimento escolar como forma de proteção a esse mal. Refletindo a incapacidade de suportar uma enorme opressão entre o superego perseguidor e o id ou ego ameaçado.
Nos jogos ou brincadeiras onde a criança apresenta esses traços paranóicos, sempre há a tentativa de se identificar com a “personagem” mais forte para dominar assim seu medo de perseguição.
Há a identificação com as histórias ou contos de fada onde a personagem do bem é perseguida pela personagem do mal. Mas em muitos casos, o final da história é modificado pela criança, quando a personagem boa e perseguida vinga o seu perseguidor de forma sádica. Podemos verificar essa fantasia em momentos onde se trabalha a oralidade em sala de aula, no consultório quando a criança relata sobre um desenho ou história ou quando produz um texto. A criança que nos apresenta este mecanismo projeta e desloca o ego no intuito de enganar o superego e impedir impulsos do id. O ego procura aliciar o id sádico, colocando-o a serviço do superego. Assim o ego consegue satisfazer de forma narcísica quando reduz a ansiedade, derrotando seus inimigos internos e externos.
Outro mecanismo usado em crianças com traços paranóicos nas sessões lúdicas, observado quando a ansiedade é evitada através da exclusão da realidade, quando o ego tenta evitar a ansiedade aliando-se ao mais forte e poderoso da fantasia. Brincadeiras onde a criança é sempre o líder poderoso (super homem) sempre vence e mata cruelmente seus inimigos. Já a criança com neurose obsessiva, apresenta em suas brincadeiras sempre uma personagem ou uma imago que impede que outra personagem usurpe, fere ou castre seus genitores (objetos parentais). Realizando o desejo onde o superego derrota o id, o que resulta ema grande raiva e ansiedade, vista nas neuroses graves onde são dominadas por este processo mental: a luta entre id e superego.
Toda criança vivencia esta neurose em seu desenvolvimento psíquico (apresentando traços obsessivos isolados no quadro geral da neurose). Mas aquelas crianças que não elaboram com sucesso esta relação do superego com o id, pode no futuro, dá lugar a uma supressão forçada da pulsão que consome toda emergia do indivíduo típica da severa neurose obsessiva no adulto. Sintomas mais graves de neurose obsessiva em crianças são: medo de dormir e diversos traços obsessivos acentuados como interessar-se durante meses por uma única brincadeira ou pedir inúmeras vezes para os adultos contarem uma única história.

Pode ser constantemente observada na análise do brincar, figuras intermediárias ou auxiliadoras entre o superego terrivelmente ameaçador e o id. Essas figuras intermediárias (uma que ajudam e outras que ameaçam ou frustram), evoluem gradualmente até chegar aos auxiliares maternos e paternos (próximos da realidade) muito importante na formação do superego.
Melanie Klein (1929) nos coloca:
A origem do conflito edipiano e o início de sua formação, o superego tem caráter tirânico (...) sua evolução posterior em direção à genitalidade depende, em última instância, de qual é a fixação oral predominante: a de sugar ou a de morder... ... quanto mais o desenvolvimento do superego e libidinal avançam em direção ao nível genital, deixando para trás os níveis pré-genitais, mas a identificações fantásticas e realizadores de desejo se aproximam dos pais reais.
No período de latência o desenvolvimento do superego e da libido chega ao fim, pois nele se instalam as exigências da realidade aumentando conforme o ego realiza a síntese do superego, a fim de finalmente atingir um equilíbrio entre id, superego e realidade.
Sabemos que a brincadeira da criança nos revela como ela age em relação a realidade. Através do lúdico podemos avaliar a situação mental da criança na medida que nos é exposto o nível de isolamento ou distorção dessa realidade. Em crianças neuróticas a realidade é reconhecida pela metade e a outra parte negada; resultando a inibição do aprendizado comprometendo sua escolarização.
As crianças que apresentam dificuldades ou distúrbios de aprendizagem apresentam um desequilíbrio acentuado entre a fantasia e a realidade. Em crianças paranóicas a relação com a realidade está subordinada ao funcionamento ativo de fantasia, predominando o lado da “irrealidade”.
Nas brincadeiras das crianças neuróticas existem a necessidade obsessiva de punição e o medo de um final feliz. Já as brincadeiras das “crianças normais” há um melhor domínio da realidade, pois são mais capazes de influenciar a realidade e viver dentro dela em conformidade com suas fantasias. E quando não há a possibilidade de alteras a situação em que se encontram, conseguem suporta-la melhor, pois a fantasia mais livre lhes oferece refúgio e maiores oportunidades de gratificação.
Melanie Klein (1929) observando brincadeiras de crianças normais, neuróticas e paranóicas concluiu: “... a ascendência de um superego aterrador, introjetado nos primeiros estágios do desenvolvimento do ego, é um dos fatores básico do distúrbio psicótico”.
A função da personificação na brincadeira das crianças é de importância universal para o desenvolvimento psíquico do indivíduo e essencial para o trabalho analítico, pois, tem o princípio transferencial.
A criança, muitas vezes, atribui ao terapeuta os papéis mais variados e contraditórios durante o brincar; alternando-os de acordo com a situação analítica e a quantidade de ansiedade latente. Uma maior atividade da fantasia e uma capacidade de personificação positiva são pré-requisitos para uma maior capacidade de transferência.
Uma das forças do trabalho analítico e da transferência é justamente a redução do conflito ou seu desenvolvimento para o mundo externo através dos mecanismos de cisão e projeção. A transferência basea - se no mecanismo da representação da personagem e um dos objetivos da análise assume os papéis que lhe são atribuídos na situação analítica. Assim, como nos adultos, o terapeuta deve apenas servir de meio em relação as diferentes imagos e fantasias vividas, para depois analisa-las.



Complexo de Édipo X Conhecimento Escolar
O complexo de Édipo é o ponto crucial de toda teoria psicanalítica. Onde o menino troca a posição oral e anal pela genital, passando a ter o objetivo libidinal da penetração por possuir o pênis. Já a menina também muda sua posição libidinal de oral para genital mas mantém o mesmo objetivo que é receptivo ao pênis.
Segundo Freud, os desejos edipianos ficam associados ao medo da castração e a sentimentos de culpa. Sendo o sentimento de culpa resultado da introjeção dos objetos amorosos edipianos, produto da formação do superego. No desenvolvimento psíquico a criança cria em sua mente uma imagem irreal e fantástica dos pais que a devoram e mordem, estruturando o medo de ser devorada e destruída. No início do complexo de Édipo a própria criança quer destruir o objeto libidinal o que dá origem a ansiedade pois teme um castigo que corresponde à ofensa. Um ego ainda muito fraco só é capaz de se defender de um superego tão ameaçador através de forte repressão.
As frustrações orais e anis que ocorrem no início do complexo de Édipo formam o protótipo de todas as frustrações posteriores para o resto da vida, representando também punição. Melaine Klein observou que “o ego ainda pouco desenvolvido quando é atacado pelo início das tendências edipianas e a incipiente curiosidade sexual relacionada a elas.”
Uma criança pequena ou bebê é oposto a uma avalanche de problemas e indagações esmagadoras, no momento que seu cognitivo ainda não está bem desenvolvido e então permanecem sem respostas por não entender bem as palavras ou não falam. Esse fenômeno fonte ainda de muito sofrimento origina ódio em relação as interpretações em geral deslocando posteriormente a incapacidade de “Aprender a Língua Pátria” ou línguas estrangeiras e também no surgimento de distúrbios diretos da fala (dislalia). A sensação de “não saber” sobre os processos sexuais, acredito eu, pode ser deslocado para o conhecimento escolar por volta de 5 anos de idade quando a criança vivência a situação edipiana, no seu auge irrigada de sentimentos de incapacidade, impotência e frustração.
Muitas crianças em face de alfabetização podem queimar etapas neste processo por estarem muito envolvidas com o complexo de Édipo e da formação do superego. E quando mais cruel for o superego, mais aterrorizante será a figura do pai castrador e maior será a força com que a criança, tentando fugir de seus impulsos genitais, pode querer destruir sadicamente os objetos parentais e o processo de escolarização.
Outro fator relacionado ao conflito edipiano e que normalmente ocorre com crianças que têm aversão à escolarização são experiências que advem da observação do coito e são provocadas ou alimentadas pela excitação que esta desperta. São as relações sexuais de crianças pequenas entre si, entre irmãos e irmãs ou amiguinhos que consistem nos atos mais diversos: olhar, tocar, defecar juntos, felação e muitas vezes tentativas diretas de realizar o coito; experiências vivenciadas na escola na maioria das vezes. Isto acontece com crianças profundamente reprimidas e possuem o investimento de um enorme sentimento de culpa.
Sentimento provocado principalmente pelo fato de que o objeto amoroso escolhido sob a pressão da excitação trazida pelo conflito edipiano, é visto como o substituto do pai, da mãe, ou de ambos.
Freud acredita que entre o terceiro e o quinto ano de vida o complexo de Édipo e a formação do superego atingem seu clímax, com eles culpa e ansiedade, período que coincide a início da vida escolar de muitas crianças. Devemos assim, prestar atenção nestes pontos cruciais que se entrelaçam neste momento de vida da criança que apresenta ou apresentará distúrbios de aprendizagem.



Teoria Freudiana
Bom, agora vamos aprofundar um pouco na teoria Freudiana, afinal precisamos conhecer bem seus conceitos básicos para posicionarmos diante dos nossos pequenos analisandos. Devemos abraçar a teoria de Freud, de Melaine Klein e de Anna Freud para que possamos, realmente realizar Psicanálise Infantil.
O que é ?
Freud escreveu “A aceitação de processos psíquicos inconscientes, o reconhecimento da doutrina da resistência e do recalcamento e a consideração da sexualidade e do complexo de Édipo são conteúdos principais da psicanálise e os fundamentos de sua teoria, e quem não estiver em condições de subscrever todos eles não deve figurar entre os psicanalistas”.
A psicanálise, não progride à maneira de avanços científicos e sociais. Ocupa-se de coisas simples, que são também complexas. O amor e o ódio, do desejo e da lei, dos sofrimentos e do prazer, de nossos atos de fala, nossos sonhos e nossas fantasias. A experiência sempre singular de cada tratamento analítico obriga o psicanalista que nele se engaja a repensar, em cada situação, a teoria que justifica sua prática. Toda a sua doutrina é marcada por seu desejo de identificar a origem do sofrimento do outro, servindo-se de seu próprio eu. A interpretação psicanalítica pode estender-se a produções humanas para as quais não se dispõe de associações livres. A psicanálise é uma psicoterapia baseada nesta investigação e especificado pela interpretação controlada da resistência, da transferência e do desejo. O emprego da psicanálise como sinônimo de tratamento psicanalítico está ligado a este sentido; exemplo: começar uma análise. O estudo teórico, a análise didática de cada participante e a supervisão são partes fundamentais no processo de formação de um analista. Psicanálise é a ciência do inconsciente que foi fundada por Sigmund Freud. Um método de investigação, que consiste essencialmente em evidenciar o significado inconsciente das palavras, das ações, das produções imaginárias (sonhos, fantasias, delírios) de um sujeito. Este método baseia-se principalmente nas associações livres do sujeito, que são a garantia da validade da interpretação.
Alguns Conceitos Básicos
AB-REAÇÃO
É uma descarga emocional pela qual um sujeito se liberta do afeto ligado à recordação de um acontecimento traumático, permitindo assim que ele não se torne ou não continue sendo patogênico. A ab-reação, que pode ser provocada no decorrer da psicoterapia, principalmente sob hipnose, e produzir então um efeito de catarse, também pode surgir de modo espontâneo, separada do traumatismo inicial por um intervalo mais ou menos longo.CATARSE
“Catharsis” é um termo grego que significa purificação, purgação. Foi utilizado por Aristóteles para designar o efeito produzido no espectador pela tragédia. O método catártico foi um método de psicoterapia em que o efeito terapêutico visado é uma “purgação” (catharsis), uma descarga adequada dos afetos patogênicos. O tratamento permite ao sujeito evocar e até reviver os acontecimentos traumáticos a que esses afetos estão ligados, e ab-reagí-los. Historicamente o “método catártico” pertence ao período (1880-1895) em que a terapia psicanalítica se definia progressivamente a partir de tratamentos efetuados sob hipnose.
AFETO
É um termo que a psicanálise foi buscar na terminologia psicológica alemã e que exprime qualquer estado afetivo, penoso ou desagradável, vago ou qualificado, quer se apresente sob a forma de uma descarga maciça, quer como tonalidade geral. Segundo Freud, toda pulsão se exprime nos dois registros, do afeto e da representação. O afeto é a expressão qualitativa da quantidade de energia pulsional e das suas variações.

REPRESENTAÇÃO
É um termo clássico em filosofia e em psicologia para designar “aquilo que se representa, o que forma o conteúdo concreto de um ato de pensamento” e “em especial a reprodução de uma percepção anterior”. Freud opõe a representação ao afeto, pois cada um destes dois elementos tem destinos diferentes nos processos psíquicos.

REALIDADE PSÍQUICA
É um termo empregado em psicanálise para designar uma forma de existência do sujeito que se distingue da realidade material (realidade factual), na medida em que é dominada pelo império da fantasia e do desejo. Historicamente, a idéia nasceu do abandono da teoria da sedução por Sigmund Freud e da elaboração de uma concepção do aparelho psíquico baseada no primado do inconsciente. Existiu uma marcante ruptura epistemológica, porquanto Freud começou a cogitar que as resistências correspondiam a repressões daquilo que estava proibido de ser lembrado, não só dos traumas sexuais realmente acontecidos, mas também dos frutos de fantasias reprimidas.
TEORIA DA SEDUÇÃO
A palavra sedução remete, antes de mais nada, à idéia de uma cena sexual em que um sujeito, geralmente adulto, vale-se de seu poder real ou imaginário para abusar de outro sujeito, reduzido a uma posição passiva: uma criança ou uma mulher, de modo geral. Em essência, a palavra sedução é carregada de todo o peso de um ato baseado na violência moral e física que se acha no cerne da relação entre a vítima e o carrasco, o senhor e o escravo, o dominador e o dominado. Foi exatamente dessa representação da coerção que Freud partiu ao construir 1895 e abandonar 1897, sua teoria da sedução, segundo a qual a neurose teria como origem um abuso sexual real. Essa teoria apoiava-se simultaneamente numa realidade social e numa evidência clínica. Nas famílias, e às vezes até na rua, as crianças muitas vezes são vítimas de violação por parte dos adultos. Pois bem, a lembrança desses traumas é tão penosa que todos preferem esquece-los, não vê-los ou recalca-los.Freud substituiu a teoria da sedução pela da fantasia, o que pressupôs a elaboração de uma doutrina da realidade psíquica baseada no inconsciente. Todos os seus contemporâneos haviam pensado em sair da idéia da causalidade real e passar para uma “outra cena”. Mas Freud foi o primeiro a apontar sua localização, resolvendo o enigma das causas sexuais: elas eram fantasísticas, mesmo quando havia um trauma real, uma vez que o real da fantasia não é da mesma natureza que a realidade material (factual).
TRAUMA
È um acontecimento da vida do sujeito que se define pela sua intensidade, pela incapacidade em que se encontra o sujeito de reagir a ele de forma adequada, pelo transtorno e pelos efeitos patogênicos duradouros que provoca na organização psíquica. Em termos econômicos, o traumatismo caracteriza-se por um afluxo de excitações que é excessivo em relação à tolerância do sujeito e à sua capacidade de dominar e de elaborar psiquicamente estas excitações.






Interpretação de Sonhos
“O sonho é a estrada real que conduz ao inconsciente”, escreveu Freud em sua obra-prima A Interpretação dos Sonhos (Die Traumdeutung) . O livro levou dois anos (1898 e 1899) para ser escrito e nele Freud edificou os principais fundamentos da teoria psicanalítica , constituindo como o ponto de apoio para todo o desenvolvimento posterior da sua obra.. Para Freud, a essência do sonho é a realização de um desejo infantil reprimido. E foi a partir desse princípio que ele elaborou as bases do método psicanalítico. Antes de Freud, os sonhos eram considerados apenas símbolos, analisados como se fossem premonições ou manifestações divinas. Freud , por meio da análise dos sonhos, mostrou a existência do inconsciente e transformou algo tido pela ciência como o lixo do pensamento, no caso os sonhos, em um instrumento revelador da personalidade humana. Os sonhos mostram uma clara preferência pelas impressões dos dias imediatamente anteriores. Têm à sua disposição as impressões mais primitivas da nossa infância e até fazem surgir detalhes desse período de nossa vida que, mais uma vez, parecem-nos triviais e que, em nosso estado de vigília, acreditamos terem caído no esquecimento há muito tempo. Para que um sonho seja interpretado é necessário que não tentemos entendê-lo de uma só vez, na sua totalidade, pois devido a ser formado no inconsciente só existe afetos e fragmentos da realidade, logo muito confuso no primeiro momento. Devemos dividi-lo em partes de acordo com o contexto do paciente e vamos decifrando-o lentamente sem adotar um critério cartesiano, pois o mesmo fragmento de um conteúdo pode ocultar um sentido diferente quando ocorre em várias pessoas ou em situações diferentes.
O sonho é justamente o fenômeno da vida psíquica normal em que os processos inconscientes da mente são revelados de forma bastante clara e acessível ao estudo. Na concepção freudiana, o sonho é um produto da atividade do Inconsciente e que tem sempre um sentido intencional, a saber: a realização ou a tentativa de realização - mais ou menos dissimulada, de uma tendência reprimida. Assim, os sonhos revelam a verdadeira natureza do homem, embora não toda a sua natureza, e constituem um meio de tornar o interior oculto da mente acessível a nosso conhecimento.
Durante o sono, tomamos as imagens oníricas por imagens reais graças ao nosso hábito mental (que não pode ser adormecido) de supor a existência de um modo externo com o qual estabelecemos um contraste com o nosso ego. Assim sendo, a interpretação dos sonhos desvela, sobretudo, os conteúdos mentais, pensamentos, dados e experiências que foram reprimidos ou recalcadas, excluídos da consciência pelas atividades de defesa do ego e superego e enviadas para o inconsciente. A parte do id cujo acesso à consciência foi impedido, é exatamente a que se encontra envolvida na origem das neuroses. Portanto, o interesse de Freud pelos sonhos teve origem no fato de constituírem eles processos normais, com os quais todos estão familiarizados, mas que exemplificam processos atuantes na formação dos sintomas neuróticos. Surge o sonho, via de regra, numa zona congestionada do entrelaçamento dos campos, de onde resulta que seu conteúdo exprima regras atinentes a distintos temas psíquicos simultaneamente; por isso não possui um só sentido latente, mas uma rede de significações emocionais, o sonho é um momento diagnóstico por excelência, identifica o sujeito. Com a criança que sonha, o analista sonha empaticamente, deixando-se levar pela iluminação que o sonho propicia, sem pressa, esperando que a precipitação insemine-lhe as idéias, para poder operar no mesmo ritmo do campo onírico. Como existe uma forte tendência a se esquecer um sonho, por obra da resistência, e quase todos assim se perdem, a função do analista é também de recordação. Ele tem a função de manter o sonho à tona por um tempo mais longo do que espontaneamente se daria e por acompanhar seu movimento de disseminação e nova concentração, e não é uma tarefa fácil, pois em nós também operam resistências.
Enquanto Freud tratava Frau Emmy von N., em 1889-1890, descobriu que ela apresentava espontaneamente os seus sonhos um material descritivo significativo. Tendo já descoberto a transferência, a resistência e a necessidade de um ego autônomo em terapia, Freud abandonou a hipnose, que criava distorções e adicionava complicações a esses fatores essenciais, e voltou-se para a livre associação e o método que conhecemos como psicanálise. Freud usou então o sonho como ponto de partida para associações que, em última instância, conduziam até as idéias inconscientes que se ocultavam atrás de sintomas e sonhos e eram responsáveis por ambos.
Pela primeira vez, o significado dos sonhos era cientificamente abordado. Todo material que compõe o conteúdo de um sonho é derivado, de algum modo, da experiência, ou seja, foi reproduzido ou lembrado no sonho. É possível que surja, no conteúdo de um sonho, um material que, no estado de vigília, não reconheçamos como parte de nosso conhecimento de nossa vigília, ou de nossa experiência.
As emoções profundas da vida de vigília, as questões e os problemas pelos quais difundimos nossa principal energia mental voluntária, não são os que costumam se apresentar de imediato à consciência onírica. No que diz respeito ao passado imediato, são basicamente as impressões corriqueiras, casuais e esquecidas da vida cotidiana que reaparecem em nossos sonhos. As atividades psíquicas mais intensamente despertas são as que dormem mais profundamente. Isso nos chama a atenção para o fato de os afetos nos sonhos não poderem ser julgados da mesma forma que o restante de seu conteúdo; e nos confrontamos com o problema de determinar que parte dos processos psíquicos que ocorrem nos sonhos deve ser tomada como real, isto é, que parte tem o direito de figurar entre os processos psíquicos da vida de vigília.Existem quatro tipos de fontes de sonho: 1-Excitações sensoriais externas (objetivas): todo ruído indistintamente percebido provoca imagens oníricas correspondentes (ex.: trovoada, cantar de um galo, etc.…); sensações de frio, calor, etc.…(ex.: vontade de urinar, partes do corpo descobertas, etc..).2-Excitações sensoriais internas (subjetivas) dos órgãos dos sentidos: excitações subjetivas da retina, alucinações hipnagógicas ou fenômenos visuais imaginativos. 3-Estímulos somáticos internos (orgânicos): distúrbios dos órgãos internos (ex.: causa sonhos de angústia) 4-Fontes psíquicas de estimulação : material importante para chegar no inconsciente, necessário para o tratamento psicanalítico.
Existem diversas causas para o nosso esquecimento dos sonhos. Geralmente esquecemos o que ocorre somente uma vez. Temos dificuldade em se lembrar o que é desordenado e confuso. Não damos importância significativa aos nossos sonhos. Embora seja verdade que os sonhos devem uma parte do seu conteúdo ao evento mental corrente, o resíduo do dia não é suficiente para produzi-los. Um sonho só se forma quando o evento corrente estabelece contato com um impulso do passado, especificamente com um desejo infantil.
Os sonhos das crianças pequenas são freqüentemente pura realização de desejos e são, nesse caso, muito desinteressantes se comparados com os sonhos dos adultos. Não levantam problemas para serem solucionados, mas, por outro lado, são de inestimável importância para provar que, em sua natureza essencial, os sonhos representam realizações de desejos. É possível que os sonhos aflitivos e os sonhos de angústia nos adultos, uma vez interpretados, revelem-se como realizações de desejos.
O sonho é a realização de um desejo, um temor realizado, uma reflexão ou uma lembrança. O sonho de conveniência satisfaz seus desejos e necessidades. A transformação de representações em alucinações não é o único aspecto em que os sonhos diferem de pensamentos correspondentes na vida de vigília. Os sonhos constroem uma situação a partir dessas imagens; representam um fato que está realmente acontecendo, eles “dramatizam” uma idéia. Mas essa faceta da vida onírica só pode ser plenamente compreendida se reconhecermos, além disso, que nos sonhos — via de regra, pois há exceções que exigem um exame especial — parecemos não pensar, mas ter uma experiência: em outras palavras, atribuímos completa crença às alucinações. Somente ao despertarmos é que surge o comentário crítico de que não tivemos nenhuma experiência, mas estivemos apenas pensando de uma forma peculiar, ou, dito de outra maneira, sonhando. É essa característica que distingue os verdadeiros sonhos do devaneio, que nunca se confunde com a realidade. Os sonhos muito freqüentes, por terem como tema a frustração de um desejo ou a ocorrência de algo claramente indesejado, podem ser reunidos sob o título de “sonhos com o oposto do desejo”. Estes sonhos podem ser elaborados, quando um paciente se encontra num estado de resistência ao analista. O segundo motivo para os sonhos com o oposto do desejo está estabelecido em um componente masoquista na constituição sexual de muitas pessoas, que decorre da inversão de um componente agressivo e sádico em seu oposto, pois os sonhos desprazerosos são, ainda assim, realizações de desejos, pois satisfazem suas inclinações masoquistas. Após estas explicações chegamos a conclusão que o sonho é uma realização (disfarçada) de um desejo (suprimido ou recalcado).
Os sonhos de angústia são abordados como uma subespécie particular dos sonhos de conteúdo aflitivo. A angústia neurótica se origina da vida sexual e corresponde à libido que se desviou de sua finalidade e não encontrou aplicação. Os sonhos de angústia são sonhos de conteúdo sexual cuja respectiva libido se transformou em angústia. É também instrutivo considerar a relação desses sonhos com os sonhos de angústia. Um desejo recalcado encontrou um meio de fugir à censura — e à distorção que a censura implica. O resultado invariável disso é que se experimentam sentimentos dolorosos no sonho. Da mesma forma, os sonhos de angústia só ocorrem quando a censura é total ou parcialmente subjugada; e, por outro lado, a subjugação da censura é facilitada nos casos em que a angústia já foi produzida como uma sensação imediata decorrente de fontes somáticas.
Assim, podemos ver claramente a finalidade para a qual a censura exerce sua função e promove a distorção dos sonhos: ela o faz para impedir a produção de angústia ou de outras formas de afeto aflitivo.
Quando o sonho é do tipo que se chama “recorrente”, é quando o sujeito teve um sonho pela primeira vez na infância e depois ele reaparece constantemente, de tempos em tempos, durante o sono adulto. O sonho típico sobre a morte de parentes queridos, encontra realizada a situação extremamente incomum de um pensamento onírico formado por um desejo recalcado (da morte), que foge inteiramente à censura e passa para o sonho sem modificação. As fontes somáticas de estimulação durante o sono (isto é, as sensações durante o sono), a menos que sejam de intensidade incomum, desempenham na formação dos sonhos papel semelhante ao desempenhado pelas impressões recentes, mas irrelevantes, deixadas pelo dia anterior. Quando alguma coisa num sonho tem o caráter de discurso direto, isto é, quando é dita ou ouvida e não simplesmente pensada (e é fácil, em geral, estabelecer a distinção com segurança), então isso provém de algo realmente falado na vida de vigília — embora, por certo, esse algo seja meramente alterado e, mais especialmente, desligado de seu contexto.
O fenômeno da distorção dos sonhos: quando nós temos um sonho e não queremos interpretá-lo ou lembrá-lo é porque estamos tentando esconder ou não queremos enfrentar algo que estávamos combatendo, estava recalcado no nosso inconsciente. Nos casos em que a realização de desejo é irreconhecível, em que é disfarçada, deve ter havido alguma inclinação para se erguer uma defesa contra o desejo; e, graças a essa defesa, o desejo é incapaz de se expressar, a não ser de forma distorcida. Podemos, portanto, supor que os sonhos recebem sua forma em cada ser humano mediante a ação de duas forças psíquicas (ou podemos descrevê-las como correntes ou sistemas) e que uma dessas forças constrói o desejo que é expresso pelo sonho, enquanto a outra exerce uma censura sobre esse desejo onírico e, pelo emprego dessa censura, acarreta forçosamente uma distorção na expressão do desejo.
Quando temos em mente que os pensamentos oníricos latentes não são conscientes antes de se proceder a uma análise, ao passo que o conteúdo manifesto do sonho é conscientemente lembrado, parece plausível supor que o privilégio fruído pela segunda instância seja o de permitir que os pensamentos penetrem na consciência. Nada, ao que parece, pode atingir a consciência a partir do primeiro sistema sem passar pela segunda instância; e a segunda instância não permite que passe coisa alguma sem exercer seus direitos e fazer as modificações que julguem adequadas no pensamento que busca acesso à consciência. Convém notar que o afeto vivenciado no sonho pertence a seu conteúdo latente, e não ao conteúdo manifesto, e que o conteúdo afetivo do sonho permaneceu intocado pela distorção que se apoderou de seu conteúdo de representações.
Quando nos referimos aos sonhos num sentido teórico, temos em mente três entidades distintas: o sonho manifesto, os pensamentos oníricos latentes e o funcionamento do sonho. Aquilo que o paciente recorda e relata como o seu sonho, o sonho manifesto, é uma mensagem critica que exige decifração. Subjacentes ao sonho manifesto estão idéias e sentimentos, alguns dos quais pertencem ao presente, alguns ao passado, alguns dos quais são pré-conscientes, outros inconscientes: é o conteúdo latente. Os pensamentos latentes, dão origem ao sonho manifesto, e estamos interessados no método pelo qual esses pensamentos latentes são transformados nas imagens recordadas como sonho. O conteúdo latente é a parte mais importante do sonho.
Os pensamentos e desejos inconscientes que ameaçaram acordar a pessoa são denominados como conteúdo latente do sonho.. Toda a significação, desejos, problemas, neuroses e até predisposições psicóticas estão nesta parte. As operações mentais inconscientes por meio das quais o conteúdo latente do sonho se transforma em sonho manifesto, damos o nome de elaboração do sonho, também chamada dramatização. O processo responsável por essa transformação, que Freud considerava a parte essencial da atividade onírica, é o funcionamento do sonho.
A primeira coisa que se torna clara para quem quer que compare o conteúdo do sonho com os pensamentos oníricos é que ali se efetuou um trabalho de condensação em larga escala. Os sonhos são curtos, insuficientes e lacônicos em comparação com a gama e riqueza dos pensamentos oníricos. Se um sonho for escrito, talvez ocupe meia página. A análise que expõe os pensamentos oníricos subjacentes a ele poderá ocupar seis, oito ou doze vezes mais espaço. O que é claramente a essência dos pensamentos do sonho não precisa, de modo algum, ser representado no sonho.
O que aparece nos sonhos, poderíamos supor, não é o que é importante nos pensamentos do sonho, mas o que neles ocorre repetidas vezes. No trabalho do sonho, está em ação uma força psíquica que, por um lado, despoja os elementos com alto valor psíquico de sua intensidade, e, por outro, por meio da sobre determinação, cria, a partir de elementos de baixo valor psíquico novos valores, que depois penetram no conteúdo do sonho.
Assim sendo, ocorrem uma transferência e deslocamento de intensidade psíquicas no processo de formação do sonho, e é como resultado destes que se verifica a diferença entre o texto do conteúdo do sono e o dos pensamentos do sonho. O processo que estamos aqui presumindo é nada menos do que a parcela essencial do trabalho do sonho, merecendo ser descrito como o “deslocamento do sonho”. O deslocamento do sonho e a condensação do sonho são os dois fatores dominantes a cuja atividade podemos, em essência, atribuir a forma assumida pelos sonhos. A conseqüência do deslocamento é que o conteúdo do sonho não mais se assemelha ao núcleo dos pensamentos do sonho, e que este não apresenta mais do que uma distorção do desejo do sonho que existe no inconsciente. Na distorção do sonho, descobrimos sua origem está na censura que é exercida por uma instância psíquica da mente sobre outra. O deslocamento do sonho é um dos principais métodos pelos quais essa distorção é obtida. Podemos presumir, portanto, que o deslocamento do sonho se dá por influência da mesma censura — ou seja, a censura da defesa sendo psíquica.
Os sonhos não têm a seu dispor meios de representar as relações lógicas entre os pensamentos do sonho. Em sua maioria, os sonhos desprezam todas essas conjunções, e é só o conteúdo substantivo dos pensamentos do sonho que eles dominam e manipulam. O que é reproduzido pelo aparente pensamento no sonho é o tema dos pensamentos do sonho e não as relações mútuas entre eles, cuja asserção constitui o pensamento. Quando ocorre uma contradição num sonho, ou ela é uma contradição do próprio sonho ou uma contradição oriunda do tema de um dos pensamentos do sonho. Uma contradição num sonho só pode corresponder a uma contradição entre os pensamentos do sonho de maneira extremamente indireta. Alguns sonhos desprezam completamente a seqüência lógica de seu material, outros tentam dar uma indicação tão completa quanto possível dela. Ao fazê-lo, os sonhos se afastam ora mais, ora menos amplamente do texto de que dispõem para manipular.
Nos sonhos a categoria dos contrários e dos contraditórios são simplesmente desconsideradas. O “não” não parece existir no que diz respeito aos sonhos. Eles mostram uma preferência particular por combinar os contrários numa unidade ou por representá-los como uma só coisa. Os sonhos se sentem livres, além disso, para representar qualquer elemento por seu oposto imaginário, de modo que não há maneira de decidir, à primeira vista, se qualquer elemento que admita um contrário está presente nos pensamentos do sonho como positivo ou negativo.
A imagem onírica pode ser composta de traços visuais pertencentes, na realidade, em parte a uma pessoa e em parte à outra. Ou, ainda, a participação da segunda pessoa na imagem onírica pode estar não em seus traços visuais, mas nos gestos que atribuímos a ela, nas palavras que a fazemos pronunciar, ou na situação em que a colocamos. Nesse último caso, a distinção entre a identificação e a construção de uma figura composta começa a perder sua nitidez. Todo sonho versa sobre o próprio sonhador. Os sonhos são inteiramente egoístas. Sempre que nosso próprio ego não aparece no conteúdo do sonho, mas somente alguma pessoa estranha, pode presumir com segurança que nosso próprio ego está oculto, por identificação, por trás dessa outra pessoa; posso inserir nosso ego no contexto. Em outras ocasiões, quando nosso ego de fato aparece no sonho, a situação em que isso ocorre pode ensinar-nos que alguma outra pessoa jaz oculta, por identificação, por trás de nosso ego. Uma conclusão no sonho representa uma conclusão nos pensamentos oníricos.
Um afeto experimentado num sonho não é de modo algum inferior a outro de igual intensidade sentido na vida de vigília. A análise nos mostra que o material de representações passou por deslocamentos e substituições, ao passo que os afetos permaneceram inalterados. A inibição do afeto, por conseguinte, deve ser considerada como a segunda conseqüência da censura dos sonhos, tal como a distorção onírica é sua primeira conseqüência.Em geral, é necessário buscar outra fonte de pensamentos do sonho, uma fonte que esteja sob a pressão da censura. Em resultado dessa pressão, essa fonte normalmente produziria, não satisfação, mas o afeto contrário. Graças à presença da primeira fonte do afeto, porém, a segunda fonte fica habilitada a subtrair do recalque seu afeto de satisfação e a permitir que ele funcione como uma intensificação da satisfação da primeira fonte. Assim, parece que os afetos nos sonhos são alimentados por uma confluência de diversas fontes e sobre determinados em sua referência ao material dos pensamentos oníricos.
Durante o trabalho do sonho, as fontes de afeto passíveis de produzir o mesmo afeto unem-se para gerá-lo.O sonho não só apresenta as formas e facetas de resistência, mas pode tornar-se um veículo para a expressão da força que se opõe à análise. A mesma resistência que usa o sonho para absorver uma hora inteira, fornece uma variação quando atrasa a apresentação para os últimos minutos. O analista não tem por que se sentir perdido quando um sonho é relatado tardiamente demais para que possa ser abordado na sessão.
A transferência, positiva ou negativa, pode converter-se numa fonte de resistência obstinada, sendo que uma e outra podem caminhar de mãos dadas. O impulso infantil inconsciente é suscetível de dotar a transferência de uma tal intensidade que a realidade da situação analítica será completamente obliterada e a aliança terapêutica viciada. Para que o trabalho da análise progrida, uma tal transferência, com suas implicações de resistência, tem de ser interpretada sem esperar que se definam as condições ótimas.
Uma fantasia consiste num desejo inconsciente trabalhado pela capacidade do pensamento lógico a fim de dar origem a uma expressão disfarçada e a uma satisfação imaginária do desejo pulsional. O bebê sonha com seus desejos que se tornam em fantasias de suas expressões diretas das pulsões e impulsos, pois as pulsões dão origem às fantasias. No adulto, o simples fato de fantasiar é para fugir de realidades dolorosas.Descrevemos o elemento dos pensamentos oníricos como uma “fantasia”.
Os sintomas histéricos não estão ligados a lembranças reais, mas a fantasias construídas com base em lembranças. A função de “elaboração secundária” que atribuímos ao quarto dos fatores envolvidos na formação do conteúdo dos sonhos mostra-nos em ação, mais uma vez, a atividade que consegue ter livre vazão na criação de sonhos diurnos sem ser inibida por quaisquer outras influências. Poderíamos simplificar isso dizendo que este nosso quarto fator procura configurar o material que lhe é oferecido em algo semelhante a um sonho diurno. No entanto, se um desses sonhos diurnos já tiver sido formado na trama dos pensamentos oníricos, esse quarto fator do trabalho do sonho preferirá apossar-se do sonho diurno já pronto e procurará introduzi-lo no conteúdo do sonho. Há alguns sonhos que consistem meramente na repetição de uma fantasia diurna que talvez tenha permanecido inconsciente.
A característica essencial dos sonhos de punição, portanto, seria que, em seu caso, o desejo formador do sonho não é um desejo inconsciente derivado do recalcado (do sistema Ics.), mas um desejo punitivo que reage contra este e pertence ao ego, embora seja, ao mesmo tempo, um desejo inconsciente (isto é, pré-consciente). Caso se pergunte se é possível interpretar todos os sonhos, a resposta deve ser negativa. Não se deve esquecer que, na interpretação de um sonho, tem-se como oponentes as forças psíquicas que foram responsáveis por sua distorção.
Relato de Freud de um sonho de uma criança
Uma criança com menos de quatro anos de idade contou ter sonhado que vira um prato enorme com um grande pedaço de carne assada e legumes. De repente, toda a carne foi comida — inteira e sem ser destrinchada. Ela não viu a pessoa que a comeu. Quem teria sido a pessoa desconhecida cujo suntuoso banquete de carne constitui o tema do sonho do menininho? Suas experiências durante o dia do sonho devem esclarecer-nos sobre o assunto. Por ordem médica, ele fora submetido a uma dieta de leite nos últimos dias. Na noite do dia do sonho ele se mostrara travesso e, como castigo, fora mandado para a cama sem jantar. Ele já havia passado por essa cura pela fome numa ocasião anterior e se portara com muita bravura. Sabia que não conseguiria nada, mas não se permitia demonstrar, nem mesmo por uma única palavra, que estava com fome.
A educação já começara a surtir efeito nele: encontrou expressão em seu sonho, que exibe o início da distorção onírica. Interpretação: Não há nenhuma dúvida de que a pessoa cujos desejos eram visados nessa generosa refeição — de carne, ainda por cima — era ele próprio. Mas, como sabia que isso não lhe era permitido, ele não se aventurou a sentar-se pessoalmente para desfrutar a refeição, como fazem as crianças famintas nos sonhos. A pessoa que se serviu da refeição permaneceu no anonimato.






Resistência
A resistência implica todas as forças dentro do paciente que se opõem aos procedimentos e processos do trabalho psicanalítico. Em maior ou menor grau, ela está presente desde o começo até o fim do tratamento. As resistências defendem o “status quo” da neurose do paciente. As resistências se opõem ao analista, ao trabalho analítico e ao ego racional do paciente. A resistência é um conceito operacional, não foi inventada recentemente pela análise. A situação analítica se transforma na arena em que as resistências se acabam revelando.
As resistências são repetições de todas as operações defensivas utilizadas pelo paciente em sua vida passada. Todas as variações de fenômenos psíquicos podem ser utilizados objetivando a resistência, mas, qualquer que seja sua fonte, a resistência age através do ego do paciente. Embora alguns aspectos de uma resistência possam ser conscientes, uma parte fundamental é realizada pelo ego inconsciente.
A terapia psicanalítica se caracteriza pela análise sistemática e completa das resistências. É trabalho do analista descobrir como o paciente resiste, a que está ele resistindo e por que ele age assim. A causa imediata de uma resistência é sempre evitar algum afeto doloroso como a ansiedade, culpa ou vergonha. Por trás deste motivo iremos encontrar um impulso instintual que disparou o afeto doloroso. No final das contas, descobrir-se-á que é o medo de um estado traumático que a resistência está tentando evitar. Desde os primórdios da psicanálise, o fenômeno resistência tem sido exaustivamente estudado em sua teoria e técnica, mas nem por isso, na atualidade, perdeu em significação e relevância. Pelo contrário, ele continua sendo considerado a pedra angular da prática analítica e, cada vez mais, os autores prosseguem estudando-o sob renovados vértices de abordagem e conceitualização.
Na qualidade de conceito clínico, a concepção de resistência surgiu quando Freud discutiu as suas primeiras tentativas de fazer vir à tona as lembranças “esquecidas” de suas pacientes histéricas. Isto data de antes do desenvolvimento da técnica da associação livre, quando ele ainda empregava a hipnose, e a sua recomendação técnica era no sentido de insistência (por parte do psicanalista) como o contrário da resistência (por parte do paciente).Este método de coerção associativa empregada por Freud incluía uma pressão de ordem física que ele próprio procedia e recomendava como “colocando a mão na testa do paciente, ou lhe tomando a cabeça entre minhas duas mãos” a fim de conseguir a recordação e verbalização dos conflitos passados. A evolução do conceito de resistência, na prática analítica, sofreu uma profunda transformação, desde os tempos pioneiros em que ela era considerada unicamente como um obstáculo de surgimento inconveniente, até os dias de hoje, quando, embora se reconheça a existência de resistências que obstruem totalmente o curso de uma análise, na grande maioria das vezes o aparecimento das resistências no processo analítico é muito bem-vindo, porquanto elas representam, com fidelidade, a forma de como o indivíduo defende-se e resiste no cotidiano de sua vida.
Assim, de modo genérico, a resistência no analisando é conceituada como a resultante da forças dentro dele, que se opõem ao analista, ou aos processos e procedimentos à análise, isto é, que obstaculizam as funções de recordar, associar, elaborar, bem como o desejo de mudar. Nessa perspectiva, continua vigente o postulado de Anna Freud (1936) de que a análise das resistências não se distingue da análise das defesas do ego, ou seja, da “permanente blindagem do caráter”.
Freud aprofundou bastante o estudo sobre resistências em “Inibição, sintoma e ansiedade” (1926), quando, utilizando a hipótese estrutural, descreveu cinco tipos e três fontes das mesmas. Os tipos derivados da fonte do ego eram:
a) Resistência de repressão: consiste na repressão que o ego faz, de toda percepção que cause algum sofrimento.
b) De transferência: a paciente manifesta uma resistência contra a emergência de uma transferência “negativa”, ou “sexual”, com o seu analista.
c) De ganho secundário: pelo fato de que a própria doença concede um benefício a certos pacientes, como histéricos, personalidades imaturas, e aqueles que estão pleiteando alguma forma de aposentadoria por motivo de doença, essas resistências são muito difíceis de abordar, eis que egossintônicas.d) As resistências provindas do id: Freud as considerava como ligadas à “compulsão à repetição” e que, juntamente com uma “adesividade da libido”, promovem uma resistência contra mudanças.
e) A resistência oriunda do superego, a mais difícil de ser trabalhada, segundo Freud, por causa dos sentimentos de culpa que exigem punição.
No clássico “Análise Terminável e Interminável” (1937), Freud introduz alguns novos postulados teórico - técnicos, e creio que se pode dizer que aí ele formula um sexto tipo de resistência: a que é provinda do ego contra o próprio ego: “em certos casos, o ego considera a própria cura como um novo perigo”. Neste mesmo trabalho de 1937, Freud aporta outras importantes contribuições sobre resistências, como são as seguintes: o conceito da Reação Terapêutica Negativa (RTN) como sendo aderido ao instinto de morte; a valorização do papel da contratransferência, sendo que ele aponta que a resistência do analisando pode ser causada pelos “erros do analista”, a observação de que a resistência no homem se deve ao medo dos desejos passivo-femininos em relação a outros homens, enquanto a resistência das mulheres deve-se em grande parte à “inveja do pênis”; e Freud também alude ao surgimento de uma “resistência contra a revelação das resistências”.
A resistência se manifesta clinicamente muitas vezes de maneira complexa ou sutil. Podemos identificar atitudes de resistência como, por exemplo:
a) Na criança silenciosa, de uma forma consciente ou inconsciente, o paciente se nega a transmitir seus pensamentos, desta forma, atentar para a comunicação não verbal.
b) O discurso intelectualizado é muito racional buscando um isolamento em alguns casos para resistir a algum afeto.
c) Uma postura fixa, intranqüila, movimentos repentinos.
d) Se fixa num determinado assunto, num tempo, (passado ou presente), em trivialidades, em assuntos externos, para evitar uma introspecção. Evita determinados temas (sexuais, agressivos). Muitas vezes, ao invés de usar sua verbalização para comunicar, usa para confundir.
e) Mostra determinado ritual, como a rigidez no horário, traz anotações, começa a sessão de uma mesma forma ou com assuntos já decorados.
f) A maneira falar é muito técnico, racional, formal. Evita certas palavras pelo seu sinônimo. Fala muito enfaticamente sobre algo. Fala por subentendidos e enigmas, fazendo da análise um jogo de adivinhação. Já outros transformam a sessão em polêmica, como se a análise fosse um jogo de opiniões.
Podemos dizer que as forças resistenciais que se erguem no “setting” analítico, são as mesmas forças dos mecanismos de defesas normais e patológicas, que o indivíduo usa no seu cotidiano para manter sua sobrevivência. As resistências são a manutenção do “status quo” que com tanto sacrifício, o paciente montou, no transcorrer de seu desenvolvimento. O principal motivo da resistência é a de evitar um “sofrimento”, ou seja, de passar por tudo aquilo, pelo qual ele mantém reprimido. São forças internas, inconscientes ou conscientes, do analisando que se opõe ao analista, ao processo, e aos procedimentos da análise, obstaculizando a função de recordar, associar, elaborar, bem como o desejo de mudar. Ao contrário, de ser um obstáculo indesejável, é sempre bem vinda, porquanto representa a forma de como o indivíduo defende-se e resiste, no cotidiano de sua vida, e compreendendo o analista, a este “modus operandis” de se defender, pode ele, demonstrar ao paciente como que ele construiu suas defesas, “como que ele funciona”.
Quanto mais frágil o ego do paciente, mais forte o é para resistir. Em pacientes mais regredidos, estes opõem sérias resistências às mudanças, e desejam manter as coisas como elas estão, não porque não desejam curar-se, mas é que não acreditam nas melhoras, ou que as mereçam, ou porque correm o “sério risco” de voltar a sentir as dolorosas experiências passadas, (traição, humilhação). “Seu objetivo de vida é para sobreviver e não para viver”.Por isso enquanto houver “re-sistência” (no sentido de re= voltar e sistência= existir), a análise flui bem, porém quando a forma de resistência é a de “desistência” (de ser), ou seja o indivíduo não tem desejo para mais nada na vida, o único desejo seu, é o não ter desejo (que podem representar os suicidas em potencial). Sempre haverá de existir resistência do início ao fim da análise. O paciente, segundo Bion, mantém com o analista, um “acordo manifesto” e um “desacordo latente”. Aparentemente ele é assíduo, colaborador, gentil, que concorda com o analista (aparentemente aceitando as interpretações), porém no fundo, ele as desvitaliza, achando-as não importantes, entra por um ouvido e sai pelo outro, e de uma maneira sutil, sem demonstrar contradição vai impondo e mantendo suas próprias opiniões, sem aceitar as do analista.
Muitas vezes conscientemente por vergonha ou medo de ser rejeitado pelo analista, escondem algum assunto que acham, vão “desonrá-lo” perante o analista, querem manter uma imagem positiva diante do analista, e para fugir do assunto passam a falar sobre trivialidades. Desta forma, muitas vezes o analista nota que o paciente tem algo que não quer dizer, e que mantém por muito tempo, um segredo consciente. O motivo pelo qual detectado, que o paciente está a esconder algo, e de sempre apontar este fato, é que um determinado segredo, funciona como um ímã, para outros segredos, recordações, e impulsos, bloqueando o livre curso da análise.Quando o paciente contar o “segredo”, sentirá um alívio e quando perceber que a reação do analista, independente de qual tenha sido o fato, foi de total naturalidade, passa a contar coisas que eram difíceis de tocar. Logo, sempre devemos tratar o segredo confessado com muito respeito, naturalidade e que merece ser tratado normalmente. Depois de confessado ou analisamos como o paciente se sente ou analisamos o conteúdo do segredo.
Os segredos geralmente têm conotação, vergonhosa e repugnante (no modo de ver do paciente), relacionados com secreção, excreção ou atividades sexuais, ou como já dito, de algo que o paciente ache que vai desabonar sua imagem perante o analista. A resistência pode ser consciente, pré-consciente ou inconsciente e pode ser expressa por meio de emoções, atitudes, idéias, impulsos, pensamentos, fantasias ou ações. A resistência em essência, uma força opositora no paciente, agindo contra o progresso da análise, contra o analista e contra os procedimentos e processos analíticos. Já em 1912 Freud havia reconhecido a importância da resistência ao afirmar: “A resistência acompanha o tratamento em todos os seus passos. Toda e qualquer associação, todo o ato da pessoa em tratamento deve contar com a resistência e ela representa um compromisso entre as forças que estão lutando pela recuperação e as forças opositoras”.
A resistência do paciente apresenta-se sob muitíssimos tipos, extremamente sutis e freqüentemente difíceis de detectar; e mostra mutações cambiantes nas formas em que se manifesta. No tratamento psicanalítico, fazemos uso da mesma técnica da interpretação de sonhos. Instruímos o paciente para se colocar em um estado de auto-observação tranqüila, irrefletida, e nos referir quaisquer percepções internas que venha a ter — sentimentos, pensamentos, lembranças — na ordem em que lhe ocorrem. Ao mesmo tempo, advertimo-lo expressamente a não deixar que algum motivo leve-o a fazer uma seleção entre essas associações ou a excluir alguma dentre elas, seja porque é muito desagradável ou muito indiscreta para ser dita, ou porque é muito banal ou irrelevante, ou que é absurda e não necessita ser dita. Sempre insistimos com o paciente para seguir apenas a superfície de sua consciência e pôr de lado toda crítica sobre aquilo que encontrar, qualquer que seja a forma que esta crítica possa assumir; e asseguramos-lhe que o sucesso do tratamento e, sobretudo sua duração, depende da conscienciosidade com que ele obedece a esta regra técnica fundamental da análise.
Já sabemos, da técnica da interpretação de sonhos, que aquelas associações que originam as dúvidas e objeções, são justamente as que invariavelmente contêm o material que leva à descoberta do inconsciente. A primeira coisa que conseguimos ao estabelecer a regra técnica fundamental é que ela se transforma no alvo dos ataques da resistência. O paciente procura, por todos os meios, livrar-se das exigências desta regra. Num momento, declara que não lhe ocorre nenhuma idéia; no momento seguinte, que tantos pensamentos se acumulam dentro de si, que não pode apreender nenhum. Ora constatamos com desgostosa surpresa que o paciente cedeu primeiro a uma e, depois a mais outra objeção crítica, revelada pelas longas pausas que introduz em seus comentários. E logo depois, admite que existe algo que de fato não pode dizer, pois tem vergonha e permite que este motivo prevaleça sobre sua promessa. Ou diz que lhe ocorreu algo, mas que isto se refere a outra pessoa, e não a ele mesmo, e, em vista disso, não há por que referi-lo.
No caso de um paciente obsessivo, haveremos de esperar táticas de resistências especiais. Freqüentemente, permitirá que a análise prossiga sem empecilhos em seu caminho, de modo que ela possa esclarecer, cada vez melhor, o enigma de sua doença. Começamos a nos admirar, por fim, de este aclaramento não se acompanhar de nenhum efeito prático, nenhuma diminuição dos sintomas. Então conseguimos perceber que a resistência se refugiou dentro da dúvida, que é própria da neurose obsessiva. É como se o paciente dissesse: ‘Sim, está tudo muito bem, muito interessante, e terei muita satisfação em prosseguir ainda mais.
O paciente também sabe, contudo, como erguer resistência sem sair de esquema de referência da análise, e a superação desta situação está entre os problemas técnicos mais difíceis. Em vez de recordar, repete atitudes e impulsos emocionais o início de sua vida, que podem ser utilizados como resistência contra o psicanalista e tratamento, através do que se conhece como ‘transferência’. Se o paciente é um homem, geralmente extrai este material de sua relação com seu pai, em cujo lugar coloca o psicanalista, e dessa forma constrói resistências que surgem a partir de seu esforço de se tornar independente, em si próprio e em sua opinião, a partir de sua ambição, cujo objetivo primeiro consistia em fazer as coisas tão bem como seu pai, ou superá-lo; ou a partir de sua aversão a se endividar, pela segunda vez na vida, com uma carga de gratidão. Assim, às vezes, tem-se a impressão de que o paciente substitui inteiramente sua melhor intenção de pôr um fim à sua doença, pela intenção alternativa de negar que o psicanalista tenha razão, de fazer com que este reconheça sua impotência e de triunfar sobre ele.
Na verdade, chegamos a compreender, finalmente, que a superação dessas resistências constitui a função essencial da análise e é a única parte do nosso trabalho que nos dá a segurança de havermos conseguido algo com o paciente. Se refletirem também que o paciente transforma todos os eventos casuais, ocorrentes durante a análise, em interferências no tratamento; que ele utiliza, como motivos para afrouxar seus esforços, todo acontecimento perturbador externo à análise, todo comentário feito por uma pessoa ou autoridade, em seu ambiente, hostil à psicanálise, toda doença orgânica eventual ou tudo aquilo que complica sua neurose, e até mesmo, na verdade, toda melhora em seu estado — se considerarem tudo isto, terão obtido uma imagem aproximada, embora ainda incompleta, das formas e dos métodos da resistência; e a luta contra esta resistência faz parte de toda análise.Portanto, temos tido a possibilidade de nos convencer de que, em ocasiões incontáveis no decurso de sua análise, a mesma pessoa abandonará sua atitude crítica e depois a reassumirá. Se estivermos na iminência de trazer-lhe à consciência uma parcela de material inconsciente especialmente desagradável, a pessoa se torna extremamente crítica; pode ter empreendido e aceito muitas coisas previamente, agora, todavia, é simplesmente como se aquelas aquisições tivessem sido anuladas; em seu esforço de se opor, a todo custo, pode oferecer o quadro completo de um imbecil emocional.
Se, contudo, conseguimos ajudá-la a superar essa nova resistência, ela recupera sua compreensão interna (insight) e entendimento. Sua faculdade crítica não é, assim, uma função independente a ser respeitada como tal, é o instrumento de suas atitudes emocionais e orienta-se segundo sua resistência.
O paciente luta contra a remoção de seus sintomas e o estabelecimento de seus processos mentais? Dizemos a nós mesmos que conseguimos descobrir, aqui, forças poderosas que se opõem a qualquer modificação na condição do paciente; devem ser as mesmas que, no passado, produziram esta condição. Durante a formação de seus sintomas, algo deve ter-se passado, que agora podemos reconstituir a partir de nossas experiências durante a resolução de seus sintomas. Através da observação de Breuer, que há uma precondição para a existência de um sintoma: algum processo mental deve não ter sido conduzido normalmente até seu objetivo normal — que era o objetivo de poder tornar-se consciente.
O sintoma é o substituto daquilo que não aconteceu nesse ponto. Agora sabemos em que ponto deve localizar a ação da força que presumimos. Uma violenta oposição deve ter-se iniciado contra o acesso à consciência do processo mental censurável, e, por este motivo, ele permaneceu inconsciente. Por constituir algo inconsciente, teve o poder de construir um sintoma. Esta mesma oposição, durante o tratamento psicanalítico, se insurge, mais uma vez, contra nosso esforço de tornar consciente aquilo que é inconsciente. É isto o que percebemos como resistência. Propusemos dar ao processo patogênico, que é demonstrado pela resistência, o nome de repressão. Para qualquer impulso, porém, a vicissitude da repressão consiste em o guarda não lhe permitir passar do sistema do inconsciente para o do pré-consciente. Trata-se do mesmo guarda que vimos a conhecer como resistência, quando tentamos suprimir a repressão por meio do tratamento analítico. O sintoma é um substituto de algo que foi afastado pela repressão. Ao investigar a resistência, constatamos que ela emana de forças do ego, de traços de caráter conhecido e latente. São estes, pois, os responsáveis pela repressão, ou, pelo menos, têm uma participação nela. Os sintomas podem ser adequadamente visualizados, como satisfações substitutivas daquilo que se perde na vida. Sem dúvida, pode-se ainda levantar toda classe de objeções à asserção de que os sintomas neuróticos são substitutos de satisfações sexuais.
Em psicanálise, os contrários não importam em contradição. Poderíamos ampliar nossa tese e dizer que os sintomas objetivam ou uma satisfação sexual ou o rechaço da mesma, e que, na totalidade, o caráter positivo de realização de desejo prevalece na histeria e o negativo, ascético, na neurose obsessiva. Se os sintomas podem servir tanto à satisfação sexual como ao seu oposto.
A resistência pressupõe a existência da anticatexia. Uma anticatexia dessa espécie é claramente observada na neurose obsessiva. Ela aparece ali sob a forma de uma alteração do ego, como uma formação reativa no ego, e é efetuada pelo reforço da atitude que é o oposto da tendência instintual que tem de ser reprimida — como, por exemplo, na piedade, na consciência e no asseio. Essas formações reativas de neurose obsessiva são essencialmente exageros dos traços normais do caráter que se desenvolvem durante o período de latência. A presença de uma anticatexia na histeria é muito mais difícil de detectar, embora teoricamente seja igualmente indispensável. Na histeria, também, uma quantidade de alteração do ego através da formação reativa é inegável e em algumas circunstâncias se torna tão acentuada que se força à nossa atenção como o principal sintoma. O conflito devido à ambivalência, por exemplo, é transformado em histeria por esse meio. O ódio do paciente por uma pessoa a quem ele ama é mantido em baixo nível por uma quantidade reduzida de ternura e apreensão da parte dela. Mas a diferença entre as formações reativas na neurose obsessiva e na histeria é que na segunda não têm a universidade de um traço de caráter, mas estão confinadas a relações específicas. Uma histérica, por exemplo, pode ser especialmente afetuosa com seus próprios filhos, os quais no fundo ela odeia; mas por causa disso ela não será mais amorosa, em geral, do que outras mulheres ou mais afetuosa para com outras crianças. A formação reativa da histeria apega-se tenazmente a um objeto específico e jamais se difunde por uma disposição geral do ego, ao passo que o que é característico da neurose obsessiva é precisamente uma difusão dessa espécie — um afrouxamento de relações na escolha de objeto. Há outra espécie de anticatexia, contudo, que parece mais adequada ao caráter peculiar da histeria. Um impulso instintual reprimido pode ser ativado (novamente catexizado) a partir de duas direções: de dentro, através de reforço de suas fontes internas de excitação, e de fora, através da percepção de um objeto que ele deseja. A anticatexia histérica é principalmente dirigida para fora, contra percepções perigosas. Assume a forma de uma espécie especial de vigilância que, por meio de restrições do ego, causa situações a serem evitadas que ocasionariam tais percepções, ou, se de fato ocorrerem consegue afastar delas a atenção do paciente. A resistência tem de ser superada na análise provém do ego, que se apega a suas anticatexias. É difícil para o ego dirigir sua atenção para percepções e idéias que ele então estabeleceu como norma evitar, ou reconhecer como pertencendo a si próprio, impulsos que são o oposto completo daqueles que ele conhece como seus próprios. Nossa luta contra a resistência na análise baseia-se nesse ponto de vista dos fatos. Se a resistência for ela mesma inconsciente, como tão amiúde, acontece devido à sua ligação com o material reprimido, nós a tornamos consciente. Se for consciente, ou quando se tiver tornado consciente, apresentamos argumentos lógicos contra ela; prometemos ao ego recompensas e vantagens se ele abandonar sua resistência. Não pode haver nenhuma dúvida ou erro sobre a existência dessa resistência por parte do ego. Mas temos de perguntar a nós mesmos se ela abrange todo o estado de coisas na análise, pois verificamos que mesmo após o ego haver resolvido abandonar suas resistências ele ainda tem dificuldades em desfazer as repressões; e denominamos o período de ardoroso esforço que se segue, depois de sua louvável decisão, de fase de ‘elaboração’. O fator dinâmico que torna uma elaboração desse tipo necessária e abrangente não está longe para se procurar. Pode ser que depois de a resistência do ego ter sido removida, o poder da compulsão à repetição — a atração exercida pelos protótipos inconscientes sobre o processo instintual reprimido — ainda tenha de ser superado. Nada há a dizer contra descrever esse fator como a resistência do inconsciente. Devem ser bem escolhidas se acrescentarem algo ao nosso conhecimento, e não constituem vergonha alguma para nós, na medida em que antes enriquecem do que invalidam nossos pontos de vista anteriores — limitando algum enunciado, talvez, que era por demais geral ou ampliando alguma idéia que foi muito estreitamente formulada.
















ASSOCIAÇÃO LIVRE
Na psicanálise clássica, para comunicar o material clínico, o paciente tenta, como forma predominante de comunicação, a associação livre. Geralmente, esse processo começa depois de concluídas as entrevistas preliminares. Nas entrevistas preliminares, o analista pôde chegar a uma avaliação da capacidade do paciente para trabalhar na situação analítica. Parte da avaliação consistiu em determinar se o paciente, em suas funções do ego, dispunha de elasticidade para oscilar entre as funções do ego, dispunha de elasticidade para oscilar entre as funções mais regressivas do ego quando estas são necessárias na associação livre e entre as funções do ego mais maduras, funções estas necessárias à compreensão das intervenções analíticas, respondendo a perguntas diretas e voltando à vida quotidiana no final da sessão. Geralmente, o paciente associa livremente durante quase toda a sessão mas ele pode também relatar sonhos e outros acontecimentos de sua vida quotidiana ou do seu passado.Uma das características da psicanálise é que se pede ao paciente que inclua suas associações quando narra seus sonhos ou outras experiências.
A associação livre tem prioridade sobre todos os outros meios de produção de material na situação analítica. Contudo, a associação livre pode ser usada erradamente para ajudar a resistência.É tarefa, então, do analista, analisar tais resistências para restabelecer o uso adequado da associação livre. Pode acontecer, também, que um paciente não consiga interromper a associação livre devido a um colapso das funções do ego. Este é um exemplo de situação de emergência que surge no decorrer de uma análise. O trabalho do analista, então, deveria ser o de tentar restabelecer o raciocínio do processo secundário e lógico do ego.



AS REAÇÕES TRANSFERENCIAIS
Para que ocorram as reações transferenciais na situação analítica, o paciente deve estar disposto e capacitado para correr o risco de alguma regressão temporária em relação às funções do ego e das relações objetais.O paciente deve ter um ego capaz de regredir temporariamente às reações transferenciais mas tal regressão deve ser parcial e reversível de modo que o paciente possa ser tratado analiticamente e ainda assim viver no mundo real.As pessoas que não se atrevem a regredir da realidade e aquelas que não conseguem voltar rapidamente à realidade são riscos indesejados para a psicanálise.Freud dividiu as neuroses em dois grupos baseando-se no fato de o paciente conseguir ou não desenvolver e manter um conjunto relativamente coerente de reações transferenciais e mesmo assim agir na análise e no mundo externo. Os pacientes com uma “neurose de transferência” conseguiam fazer isso ao passo que os pacientes sujeitos a uma “neurose narcísica” não o conseguiam.
Analisando o Material do Paciente
O termo “analisar” é uma expressão compacta que abrange aquelas técnicas que aumentam a compreensão interna. Em geral, inclui quatro procedimentos diferentes:
a)Confrontação: o fenômeno em questão tem que se ter tornado evidente, tem que ter ficado explícito ao ego consciente do paciente.Por exemplo, antes que eu possa interpretar o motivo que possa ter um paciente para eviar um determinado assunto na sessão, tenho primeiro de fazer com que ele enfrente o fato de estar evitando alguma coisa. Algumas vezes, o próprio paciente vai perceber tal fato e não terei necessidade de fazê-lo.Todavia, antes que sejam tomadas quaisquer medidas analíticas posteriores, deve ter-se certeza de que o paciente discerne dentro de si mesmo o fenômeno psíquico que estamos tentando analisar.
b)Esclarecimento: abrange aquelas atividades que visam a colocar o fenômeno psíquico sendo analisado sob um enfoque cerrado.Os detalhes importantes têm que ser desenterrados e cuidadosamente separados dos assuntos não ligados à questão.A variedade ou padrão especial do fenômeno em questão tem que ser separado e isolado.
c)Interpretação: é este procedimento que distingue a psicanálise de todas as outras psicoterapias porque, em psicanálise, a interpretação é o instrumento decisivo e fundamental. Todos os outros procedimentos preparam para a interpretação ou ampliam uma interpretação ou então cada um dos outros procedimentos talvez tenha, também, de ser interpretado.Interpretar significa tornar consciente um fenômeno inconsciente.Mais precisamente, significa tornar consciente o significado, fonte, história, modo ou causa inconscientes de um determinado fato psíquico.
d)Elaboração: abrange um conjunto complexo de procedimentos e processos que ocorrem depois que há uma compreensão interna. O trabalho analítico que possibilita que uma compreensão interna provoque uma mudança é o trabalho da elaboração. Ela abrange, no geral, nas investigações complexas, progressivas e repetitivas das resistências que impedem que uma compreensão interna provoque uma mudança. Além de ampliar e aprofundar a análise das resistências, as reconstruções também têm uma importância especial.A elaboração põe em movimento uma variedade de processos circulares nos quais a compreensão interna, a memória e a mudança de comportamento se influenciam reciprocamente.Deve assinalar-se que parte do trabalho de elaboração é feito pelo paciente fora da sessão analítica. A elaboração é o elemento que precisa e toma mais tempo na terapia psicanalítica. Em raríssimas ocasiões a compreensão interna realmente provoca uma mudança rápida no comportamento; e nesse caso, geralmente é transitória ou permanece isolada e não-integrada.Em geral, é necessária uma boa dose de tempo para superar as forças poderosas que resistem à mudança e para estabelecer mudanças estruturais profundas.


A teoria de Melanie Klein
Klein, Melanie, (Viena,1882-Londres,1960), psicanalista inglesa. No plano político, o kleinismo é um dos grandes componentes do moderno legitimismo freudiano, uma vez que se desenvolveu como escola no interior da International Psychoanalytical Association (IPA), sem contestar a idéia, própria do freudismo e da psicanálise, da necessidade de uma organização universalista (e não comunitarista) do movimento psicanalítico. Melanie Klein foi o principal expoente do pensamento da segunda geração psicanalítica mundial. Deu origem a uma das grandes correntes do freudismo, o kleinismo, e graças a Ernest Jones, que a chamou para Grã-Bretanha, contribuiu para o desenvolvimento considerável da escola inglesa de psicanálise.
Transformou totalmente a doutrina freudiana clássica e criou não só a psicanálise de crianças, mas também uma nova técnica de tratamento e de análise didática, o que fizera dela um chefe de escola. Sua obra, composta essencialmente de cerca de cinqüenta artigos e de um livro, “A psicanálise de crianças”, foi traduzida em quinze línguas e reunida em quatro volumes. Acrescenta-se uma “Autobiografia” inédita e uma importante correspondência. A tradução francesa, realizada em parte por Marguerite Derrida, é de excepcional qualidade. Muitas obras foram dedicadas a Melaine Klein, entre as quais as de Hannah Segal, sua principal comentadora, e a de Phyllis Grosskurth, sua biógrafa. Um dicionário dos conceitos kleinianos foi realizado por R.D. Hinshelwood em 1991.
Na história do movimento psicanalítico, deu-se o nome de kleinismo, em oposição ao annafreudismo, a uma corrente representada pelos diversos partidários de Melanie Klein, dentre os quais se incluem os pós-kleinianos que se pautam em Wilfred Ruprecht Bion. Foi depois do período das Grandes Controvérsias, que desembocara, em 1954, numa clivagem da British Psychoanalytical Society (BPS) em três tendências, que o termo se impôs.Diversamente do annafreudismo, o kleinismo não é uma simples corrente, mas uma escola comparável ao lacanismo.
Com efeito, constitui-se como um sistema de pensamento a partir de um mestre (no caso, uma mulher) que modificou inteiramente a doutrina e a clínica freudianas, cunhando novos conceitos e instaurando uma prática original da análise, da qual decorreu um tipo de formação didática diferente da do freudismo clássico. A partir do ensino de Karl Abraham, Melanie Klein e seus sucessores fizeram escola, integrando na psicanálise o tratamento das psicoses (esquizofrenia, “borderlines”, distúrbios da personalidade ou do “self”), inventando o próprio princípio da psicanálise de crianças (por uma rejeição radical de qualquer pedagogia parental) e, por fim, transformando a interrogação freudiana sobre o lugar do pai, sobre o complexo de Édipo e sobre a gênese da neurose e da sexualidade numa elucidação da relação arcaica com a mãe, numa evidenciação de ódio primitivo (inveja) próprio da relação de objeto e, por último, numa busca da estrutura psicótica (posição depressiva/posição esquizo - paranóide) que é característica de todo sujeito. Assim, os kleinianos, tal como os lacanianos, inscreveram a loucura bem no âmago da subjetividade humana. Por outro lado, definiram um novo âmbito para a análise, muito diferente do dos freudianos, baseado em regras precisas e, em especial, num manejo da transferência que tende a excluir da situação analítica qualquer forma de realidade material em prol de uma realidade psíquica pura, conforme à imagem que o psicótico tem do mundo e de si mesmo.
Daí a criação do termo “acting in”, decorrente de “acting out”.O kleinismo define-se, portanto, ao lado do lacanismo e diversamente do annafreudismo, como uma verdadeira doutrina, que tem sua coerência própria, um corpo conceitual específico, um saber clínico autônomo e um modo de formação didática particular. Como reformulação da doutrina freudiana original, ele faz parte do freudismo, do qual reconhece os fundamentos teóricos, os conceitos e a anterioridade histórica. É uma das modalidades interpretativas do freudismo, articulada com o antigo suporte biológico e darwinista deste último. Nessas condições, não revisou os fundamentos epistemológicos dele nem propôs qualquer teoria do sujeito, como fez o lacanismo.
Enquanto o annafreudismo encarna, através da figura da filha do pai, o vínculo de identidade que interligou os membros da antiga diáspora vienense exilada nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, o kleinismo é uma doutrina em expansão, sobretudo nos países latino-americanos (Brasil e Argentina), onde ajuda a psicanálise a enfrentar as outras escolas de psicoterapia que começaram a ameaça-la, a partir da década de 1970, em virtude de sua falta de criatividade. Por ser uma escola de pensamento que alia um saber clínico a uma teoria, o kleinismo erigiu-se sobre uma crítica da forma dogmática do freudismo, para em seguida produzir, no próprio interior do freudismo de que nasceu, uma nova idolatria do mestre fundador, uma historiografia de tipo hagiográfico e um novo dogmatismo.
E ainda não suscitou, como o freudismo, as condições internas para uma crítica a esse dogmatismo. Vejamos um pouco mais sobre a história do kleinismo. Em 1927, M.Klein instala-se em Londres, por instâncias de E.Jones, criador e organizador da Sociedade Britânica de Psicanálise. Ali ensina sua teoria e funda uma escola, o que lhe vale, a partir de 1938, conflitos muitos violentos com A.Freud. Teoricamente, esta lhe censura as concepções de objeto, supereu, Édipo e fantasmas originários; para ela, a inveja, a gratidão e as posições depressivas e esquizo - paranóide não são psicanalíticas. Clinicamente, censura-a por afirmar que é possível uma transferência no tratamento da criança, tornando desnecessário todo o trabalho com os pais. M. Klein recusa tais críticas, acusando sua rival de não ser freudiana.
Em 1946, são criados dois diferentes grupos de formação de psicanalistas e, em 1955, é fundado o Melanie Klein Trust. Com notável aprofundamento da formação dos juízos de atribuição e de existência, dos quais S.Freud tinha formulado os princípios, em seu artigo “A Negativa” (Die Verneinung, 1925), a teoria kleiniana estrutura-se sobre dois conceitos: o da posição esquizo - paranóide, que combate de forma ilusória, mas violenta, toda perda, e o da posição depressiva, na qual a perda é realmente comprovada. Essas duas posições referem-se à perda, ao trabalho de luto e à reparação, consecutivos, de dois objetos psíquicos parciais e primordiais, dos quais todos os demais nada mais são do que substitutos metonímicos: o seio e o pênis.
Ambos os objetos parciais entram em jogo em uma cena imaginária inconsciente, chamada por M.Klein de “cena materna”. Nesse teatro do “eu - nascente”, sobre essa outra cena onde são representadas sua existência e sua atribuição, tais objetos irão surgir ou voltar às coxias e a seu depósito de acessórios. Nele, suas representações psíquicas encontram os índices de realidade, os traços reais e as representações que servem para lhes dar uma identidade familiar e perceptível, pois correspondem a outros objetos reais, que são os sujeitos parentais. M.Klein fornece, desses travestimentos identificatórios, elaborados pela psique do “infantes” –esse imaginário irá, de fato, conhecer sua quintessência entre os três e os dez meses graças aos quais o “infantes” irá se encontrar, no estranho dos outros, um belo exemplo literário, em uma obra de M.Ravel, a respeito de um texto de Colette (1925): “L’enfant et les sortilèges”.
Assim, a realidade exterior não é, em sua teoria, nada mais do que uma “Weltanschauung” da própria realidade psíquica. Porém, ela permite que uma criança muito pequena se assegure uma certa identidade de percepção e de pensamento entre seus objetos imaginários e outros mais reais; a seguir, adquire, progressivamente, juízos de atribuição e de existência a seu respeito, a fim de constituir um domínio das angústias com as quais é confrontada pelas pulsões de vida e de morte, pois essa pulsões exigem dela, para sua satisfação, objetos reais ou substitutos imaginários.
A esse respeito, a teoria kleiniana desenvolve uma elaboração interessante. Esses objetos, que são para a criança o seio e o pênis, bem como seus desdobramentos reais, parciais ou totais (pais, irmão, irmã, meia-irmã, etc.), poderia o “infantes” entrega-los, sem discernimento, à exigência pulsional, mesmo que representem para ele uma fundamental aposta atributiva, existencial e identificatória, e mesmo que, pela identificação com eles, poderia ele próprio se entregar às pulsões? Não o poderá fazer sem discernimento, mas em que consiste esse discernimento? Adquire a consistência de “dois operadores defensivos”, aos quais sucede, quando operam, “uma série de processos de tipo sublimatório”. Os dois operadores são, um deles, de ordem quantitativa e, outro, de ordem qualitativa. Quantitativamente, o objeto é fracionado, dividido, fragmentado e multiplicado, por uma espécie de clivagem (clivagem do objeto); qualitativamente, é uma espécie de mínimo divisor comum que divide tudo o que está clivado em duas únicas categorias: a do bom e a do mau. Esses dois operadores defensivos, que, portanto, são a multiplicação por clivagem e as divisões pela classificação, a seguir, dão acesso a processos de tipo sublimatório: a introjeção para si, a projeção para fora e a identificação com aquilo que é introjetado ou projetado, podendo esses processos se combinar, para produzir, particularmente, identificações projetivas e introjetivas. Esses processos são sublimatórios, pois mediatizam as relações do sujeito com a pulsão, cuja satisfação precisa operar desvios suspensivos, desvios esses justamente impostos por estes processos. Portanto, quando são instalados esses circuitos pulsionais complexos, é que são produzidos as sublimações, objetos, pulsões, angústias e outros afetos, que podem ser conservados, rejeitados, retomados, destruídos, idealizados, reparados, em suma elaborados, assim mediatizados pela criança; o que lhe permite abrir-se para juízos de atribuição e de existência, bem como para possibilidades identificatórias, pelas quais, para ela, o objeto só adquire valor por sua perda real.
Essa perda também é a que deixa definitivamente cair alguma coisa no inconsciente, o que exprime o conceito de recalcamento primário. Sublimações, defesas, apostas atributivas, existenciais ou identificatórias, controle das pulsões e das angústias, recalcamento; são estas as funções tradicionalmente atribuídas, em psicanálise, ao eu. Pois a instância do eu, em ação imediatamente para essas funções vitais, é, na teoria kleiniana, de saída confrontada com um Édipo, que seus objetos imaginários, somados aos da realidade, para fundar sua identidade, colocam em cena precocemente.
E, com ele, apresenta-se um supereu feroz e aterrador, que atormenta o sujeito, introduzindo nele seu sentimento inconsciente de culpa. Todavia, embora M.Klein não teorize exatamente nesses termos, sua concepção de eu pressupõe um sujeito diferente dele, com o qual não pode se confundir. De fato, à medida que as relações objetais substituem por objetos imaginários da realidade exterior, o eu, que comanda as sublimações por ele produzidas, poderia ele se tornar uma coisa diferente desses objetos, como eles trabalhando por processos de tipo sublimatório, como eles dividido por idênticas clivagens, como eles reduzido às mesmas classificações e, finalmente, como eles levado à destinos similares, pela relação com o isso? A partir de suas elaborações sobre a identificação, M.Klein o trata como tal. Mas, desde logo, qual poderia ser a sublimação, senão a de se tornar um sujeito que lhe seja outro, que se divida, para melhor poder subverter e não ter de sustentar unicamente o desejo? De que modo, na teoria kleiniana, o eu só adquire valor com sua perda real, com seu recalcamento radical, para que advenha o sujeito? Através do superego.
Para M.Klein, esse conceito está longe de ser apenas a instâncias coercitiva e moral, incluída nas três instâncias criadas por Freud, em sua segunda tópica. Em 1941, para mostrar a Jones as malversações teóricas de A.Freud, ela lhe escreve que o supereu é “o ponto máximo” da teoria freudiana: “Em minha opinião, a psicanálise percorreu um caminho mais ou menos retilíneo, até essa descoberta decisiva, que nunca mais foi igualada”. Esse ponto máximo é, literalmente, o falo da teoria kleiniana. A partir de J.Lacan, o falo é o significante do desejo; toda teoria tem o seu, para adquirir consistência; na teoria freudiana, por exemplo, é a castração. Resgatá-lo permite saber, a partir do significante do desejo que ele conceptualiza, que lei simboliza sua lógica. Portanto, em M.Klein, a lógica do desejo e sua lei adquirem sentido no supereu.
A angústia primária não está relacionada com a castração, mas com um desejo de destruição primordial, que é o desejo de morte do outro real. Esse desejo põe em cena um fantasma, onde o sujeito destrói o corpo materno, para apropriar-se de seus órgãos e, em particular, do “pênis paterno”, “protótipo de todos os objetos” contidos nesse corpo. Não é, pois, apenas o órgão que a criança deseja introjetar em si, mas também um “objeto totêmico”, ou objeto ancestral e protetor; mas, como todo o totem, é proibido obter gozo dele ou daquilo que é ordenado por lei. Sua introjeção traz também consigo o mau: o interdito do incesto, a angústia correlativa, correspondente ao desejo de transgredi-lo, a culpa que o inscreve em uma dimensão moral (ou cultural) e a necessidade de punição, que irá constituir o processo reparador. Na teoria kleiniana, o totem de duas faces, o falo, tem um nome simbólico: o supereu, instância arcaica, no sentido etimológico daquilo que é originário e fundador, daquilo que comanda e dirige, conduz e sanciona, atribui e retoma: “Coisa que morde, que devora e que corta”. Por isso, o Édipo é pré-genital; sua vivência traumática não pode ser simbolizada pelo “infantes”, a não ser pelo discurso de um outro; o recalcamento é secundário a ela, só se sustentando pela parte persecutória do supereu; a relação do pequeno sujeito com essa instância pode prefigurar as futuras identificações com um agressor: portanto, é dela que irão depender os mecanismos identificatórios. Par despojar a mãe do pênis paterno que ela detém em seu seio, a criança precisa atravessar a primeira fase de desenvolvimento, que é uma “fase de feminilidade”, de uma importância vital e pouco reconhecida até agora, pois, nela, a criança descobre o desejo de possuir um determinado órgão: o pênis do pai. Privar dele a mãe significa, para o sujeito muito pequeno, impedi-la de produzir seus dois principais equivalentes simbólicos: o filho e as fezes; equivalentes que são, em sua a origem, ao desejo de ter, a “inveja”, e ao desejo de perder, o “ódio”. Nesse período precoce do desenvolvimento, a mãe, que leva embora as fezes do filho, também é a mãe que o desmembra e o castra (...).
Em termos de realidade psíquica, ela já é, também ela, o “castrador”.“Também ela”: portanto, o supereu deve ser castrador, conforme as imagos materna e paterna. Para M.Klein, aliás, o filho unifica primeiramente seus dois genitores; só os dissocia para garantir suas alianças imaginárias, quando se envolve em conflitos com eles. Conflitos relacionados ao complexo Édipo precoce. Só será possível uma saída pacífica pela identificação somente com o pai. “Por mais forte que seja a influência do aspecto materno na formação do supereu, é, entretanto, o superu paterno que, desde o começo, possui um poder decisório”. Esse retorno ao pai está situado no momento em que o “visível” entra em cena, quando o pênis real “torna-se objeto do olhar”. Essa fase mais narcisista é reparadora, pois nela o pênis passa do interior da cena materna para fora do corpo do outro.
Assim, esse real estabelece limites ao imaginário. Que, com freqüência, a mãe seja a fornecedora, isso faz com que seu filho seja capaz de se encontrar; ele então percebe que só pode receber dela aquilo que lhe faz falta. A partir dessa falta, o supereu, aliviado de seu peso, readquire significância totêmica e volta a ser lei do desejo, em lugar de ser um identificante persecutório. Entre as principais obras de M.Klein estão: “A psicanálise de crianças” (1932), “Ensaio de psicanálise” (1947), “Desenvolvimento em psicanálise” (1952) e “Inveja e gratidão” (1957).

Uma visão Kleiniana sobre Resistência
Klein descreveu a resistência na análise como sendo a manifestação de uma transferência negativa. Em contraste, a psicanálise clássica considerava a resistência como uma repressão da libido. Trata-se de uma diferença decisiva, que dá origem a tipos de interpretação radicalmente diferentes e expectativas de eficácia terapêutica também radicalmente diferente. Na opinião de Klein, a resistência apresentava-se como uma forma de evitar o relacionamento com ela própria ou como uma forma de evitar os jogos com brinquedos: “Minha experiência confirmou minha crença de que, se construo a antipatia, imediatamente como ansiedade e sentimento transferencial negativo e a interpreto como tal em conexão com o material que a criança ao mesmo tempo produz, remontando-o depois de volta ao seu objeto original, qual seja, a mãe, posso imediatamente observar que a ansiedade diminui. Isto se manifesta pelo começo de uma transferência mais positiva e, com esta, de um brincar mais vigoroso. Pela resolução de alguma parte da transferência negativa, obteremos então, tal como acontece com os adultos, um aumento da transferência positiva e esta, de acordo com a ambivalência da infância, será em breve, por sua vez, sucedida por uma emergência da negativa”. (Klein, 1927).
Klein estudou as inibições no brincar com grandes detalhes e deu-se conta do impacto enorme dos sentimentos agressivos no desenvolvimento da simbolização e, portanto, na totalidade do funcionamento intelectual. Klein demonstrou que o brincar era tão simbólico quanto as palavras, ainda que envolvesse descarga muscular. Dessa maneira, a fantasia não era necessariamente um método de descarga alternativo à ação corporal, como Freud contentara-se em deixá-la ser, mas concomitante profundamente importante, senão a mola mestra, da descarga física de energia. A formação de símbolos é um recurso primário na expressão, tanto interna quanto externa da atividade inconsciente da fantasia, em qualquer momento determinado.
A externalização destas fantasias no brincar simbólico e na personificação é impulsada pela necessidade de colocar a certa distância estados internos de perseguição. Klein estava demonstrando, portanto, que os símbolos, como substitutos, constituem uma estratégia defensiva, e que a análise do processo de simbolização é uma análise das defesas. Mediante sua compreensão da personificação dos objetos internos e, eventualmente de partes do ego (identificação projetiva), percebeu que estava lidando com o tipo de defensividade que é adotado pelos psicóticos. A resistência psicótica é um ataque à capacidade que tem a mente de pensar e conhecer (a pulsão epistemofílica), mencionado por Bion (1959) como “ataques aos elos de ligação”. Na teoria da esquizofrenia de Bion, ele descreveu os ataques ao próprio ego, que representavam as experiências que Klein (1946) encarava com sendo os efeitos da pulsão de morte agindo dentro –a sensação de estar-se despedaçando. Bion descreveu particularmente um ataque à percepção da realidade interna.
A resistência, igualada à transferência negativa, representava uma manifestação clínica da pulsão de morte. Freud pouco depois da Primeira Guerra Mundial (1920) admitiu a existência da agressão. O conceito veio a mais ou menos se fundir com o de reação terapêutica negativa. A presunção geral tem sido de que, por correta que tenha sido a interpretação que provocou uma reação negativa no paciente, tem de haver uma “mais correta”, que entenderia esta reação negativa. Klein foi das primeiras entre os que consideraram a agressão como sendo pulsional. Entretanto, por enfatizar as fantasias inconscientes, apoiava a visão de Freud de que as pulsões nos seres humanos são extraordinariamente maleáveis. Klein achava que a inevitabilidade da agressão em si não era otimista nem pessimista; cada indivíduo se empenha em sua própria luta pessoal contra seus próprios impulsos agressivos. Freud deu-se conta, para sua consternação, que havia alguns pacientes que reagiam mal às interpretações analíticas: ficavam piores com interpretações boas, antes que melhores. Ele ficou afrontado pelo hábito do “Homem dos Lobos” de produzir “reações negativas” transitórias; todas as vezes que algo havia sido conclusivamente esclarecido, ele tentava contradizer o efeito.(Freud-1917). Várias tentativas foram feitas para compreender a reação:a) Culpa: Freud atribuiu-a à culpa, especialmente à culpa inconsciente, que leva a uma necessidade de punição; o paciente alcança esse castigo sob a forma de padecer de má saúde.
b) Pulsão de morte: Em 1924, Freud especulou sobre o papel da pulsão de morte na reação terapêutica negativa.
c) Posição depressiva: Riviere (1936) tirou algumas conclusões à luz da posição depressiva de Klein, as quais mostravam a importância das relações objetais envolvidas na culpa inconsciente: um medo de ser responsável pelo dano ou pela morte do objeto bom, especialmente do objeto bom internalizado. Apontou ela que se interpretar a um paciente culpado o que se acha errado com ele, isso o fará sentir-se mais culpado ainda, por estar dessa maneira errado. Advogou ela o equilíbrio entre interpretações das partes más do sel e interpretações das partes boas, ponto de vista endossado por Rosenfeld (1987).d) Inveja: No mesmo ano (1936), Horney argumentou que a reação terapêutica negativa resultava da inveja do analista, isto é, de um desejo de estragar o trabalho deste último. Sob muitos aspectos, isto remonta a um breve artigo da autoria de Abraham (1919), a respeito de pacientes que não podem suportar o trabalho bem-sucedido do analista.












Anna Freud
Assim como os lacanianos, os annafreudianos (Anna Freud 1895-1982) também são freudianos. Psicanalista britânica, de origem austríaca, foi a caçula dos seis filhos de Sigmund e Martha Freud. Presidente do Instituto de Formação Psicanalítica de Viena, de 1925 a 1938, refugiou-se com o pai em Londres, em 1938, onde fundou, em 1951, a Clínica Hampstead, centro de tratamento, formação e pesquisas em psicoterapia infantil. Foi uma das primeiras pessoas a realizar psicanálise infantil. A suas concepções irão se opor às de M. Klein, em particular do lado da exploração do complexo de Édipo. A. Freud temia a deterioração das relações da criança com seus pais, se fossem analisados seus sentimentos negativos a respeito deles.
Ela publicou “O tratamento psicanalítico de crianças” (1927), “O ego e os mecanismos de defesa” (1937), “O normal e o patológico na criança” (1965).Na história do movimento psicanalítico, deu-se o nome de annafreudismo, em oposição ao kleinismo, a uma corrente representada pelos diversos partidários de Anna Freud. Foi depois do período das Grandes Controvérsias, que levou em 1945, a uma clivagem entre três tendências no interior da “British Psychoanalytical Society” (BPS), que esse termo se impôs, para designar uma espécie de classicismo psicanalítico pós-freudiano, encarnado pela filha de Sigmund Freud. Remetia, ao mesmo tempo, à origem vienense da doutrina freudiana e a um certo modo de praticar a análise, privilegiando conceitos como os de eu e de mecanismos de defesa.
A divisão entre o kleinismo e o annafreudismo, que se superpõe à divisão entre psicose e neurose, passa pela questão da psicanálise de crianças. Foi a corrente kleiniana e pós - kleiniana, com efeito, que estendeu o tratamento psicanalítico, centrado na neurose e no complexo de Édipo, às crianças pequenas, aos “borderlines” e à relação arcaica com a mãe, enquanto os annafreudianos concebiam o tratamento das psicoses a partir do das neuroses, introduzindo nele uma dimensão social e profilática que está ausente da doutrina kleiniana, a qual só leva em conta a realidade psíquica ou o imaginário do sujeito.
Tal como o kleinismo e a “Ego Psychology”, da qual se aproxima, a corrente annafreudiana desenvolveu-se no interior da “International Psychoanalytical Association” (IPA), essencialmente na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos, onde os vienenses emigrados, muito ligados à família de Freud, esforçaram-se por defende-lo, numa espécie de vínculo de identidade que se somava às vicissitudes do exílio. O annafreudismo e o kleinismo fazem parte, tal como o lacanismo e diversas outras correntes externas à IPA, do chamado freudismo, na medida em que todos se reconhecem, afora suas divergências, na doutrina fundada por Freud, e em que se distinguem claramente das outras escolas de psicoterapia pela adesão à psicanálise, isto é, ao tratamento pela fala, como único ponto de referência do tratamento psíquico, e aos conceitos freudianos fundamentais: o inconsciente, a sexualidade, a transferência, o recalque e a pulsão.

Mecanismos de Defesa
São diferentes tipos de operações em que a defesa pode ser especificada.Os mecanismos predominantes diferem segundo o tipo de afecção considerado, a etapa genética, o grau de elaboração do conflito defensivo, etc. Não há divergências quanto ao fato de que os mecanismos de defesa são utilizados pelo ego, mas permanece aberta a questão teórica de saber se a sua utilização pressupõe sempre a existência de um ego organizado que seja o seu suporte. Foi este o nome que Freud adotou para apresentar os diferentes tipos de manifestações que as defesas do Ego podem apresentar, já que este não se defronta só com as pressões e solicitações do Id e do Superego, pois aos dois se juntam o mundo exterior e as lembranças do passado. Quando o Ego está consciente das condições reinantes, consegue ele sair-se bem das situações sendo lógico, objetivo e racional, mas quando se desencadeiam situações que possam vir a provocar sentimentos de culpa ou ansiedade, o Ego perde as três qualidades citadas. É quando a ansiedade-sinal (ou sinal de angústia), de forma inconsciente, ativa uma série de mecanismos de defesa, com o fim de proteger o Ego contra uma dor psíquica iminente.Há vários mecanismos de defesa, sendo alguns mais eficientes do que outros. Há os que exigem menos despêndio de energia para funcionar a contento. Outros há que são menos satisfatórios, mas todos requerem gastos de energia psíquica.
As defesas do ego podem dividir-se em:
a)Defesas bem sucedidas, que geram a cessação daquilo que se rejeitab)Defesas ineficazes, que exigem repetição ou perpetuação do processo de rejeição, a fim de impedir a irrupção dos impulsos rejeitados.As defesas patogênicas, nas quais se radicam as neuroses, pertencem à segunda categorias .Quando os impulsos opostos não encontram descarga, mas permanecem suspensos no inconsciente e ainda aumentam pelo funcionamento continuado das suas fontes físicas, produz-se estado de tensão, com possibilidade de irrupção.
Daí por que as defesas bem sucedidas, que de fato, menos se entendem, têm menor importância na psicologia das neuroses. Nem sempre, porém, se definem com nitidez as fronteiras entre as duas categorias; há vezes em que não se consegue distinguir entre “um impulso que foi transformado pela influência do ego”e “um impulso que irrompe com distorção, contra a vontade do ego e sem que este o reconheça”.Este último tipo de impulso há de produzir atitudes constrangedoras, há de repetir-se continuamente, jamais permitirá relaxamento pleno gerará fadiga.

Sublimação
É o mais eficaz dos mecanismos de defesa, na medida em que canaliza os impulsos libidinais para uma postura socialmente útil e aceitável.As defesas bem sucedidas podem colocar-se sob o título de sublimação, expressão que não designa mecanismo específico; vários mecanismos podem usar-se nas defesas bem sucedidas; por exemplo, a transformação da passividade em atividade; o rodeio em volta do assunto, a inversão de certo objetivo no objetivo oposto. O fator comum está em que, sob a influência do ego, a finalidade ou o objeto (ou um e outro) se transforma sem bloquear a descarga adequada. ( O fator de valoração que habitualmente se inclui na definição de sublimação é melhor omitir ). Deve-se diferenciar a sublimação das defesas que usam contracatexias; os impulsos sublimados descarregam-se, se bem que drenados por uma trilha artificial, enquanto os outros não se descarregam.Na sublimação, cessa o impulso original pelo fato de que a respectiva energia é retirada em benefício da catexia do seu substituto. Nas outras defesas, a libido do impulso original é contida por uma contracatexia elevada.As sublimações exigem uma torrente incontida de libido, tal qual a roda de um moinho precisa de um fluxo d’água desimpedido e canalizado. É por isto que as sublimações aparecem após a remoção de certa repressão. Para usar uma metáfora, as forças defensivas do ego não se opõem frontalmente aos impulsos originais, conforme ocorre no caso das contracatexias, mas incidem angularmente; daí uma resultante em que se unificam a energia instintiva e a energia defensiva, com liberdade para atuar.
Distinguem-se as sublimações das gratificações substitutivas neuróticas pela sua dessexualização, ou seja, a gratificação do ego já não é fundamentalmente instintiva.Quais são os impulsos que experimentam vicissitudes desta ordem e quais são as condições que determinam a possibilidade ou a impossibilidade de sublimação? Se não forem rejeitados pelo desenvolvimento de uma contracatexia (o que os excluirá do desenvolvimento ulterior da personalidade), os impulsos pré-genitais e as atitudes agressivas concomitantes organizam-se, mais tarde sob a primazia genital.A realização mais ou menos completa desta organização é indispensável para que tenha êxito a sublimação daquela parte da pré - genitalidade que não é usada sexualmente no mecanismo do pré - prazer. É muito pouco provável a existência de sublimação da sexualidade genital adulta; os genitais constituem um aparelho que visa à realização da descarga orgástica plena, isto é, não sublimada. O objeto da sublimação são os desejos pré-genitais.Se estes, porém, tiverem sido reprimidos e se permanecem no inconsciente, competindo com a primazia genital, não podem ser sublimados.
A capacidade de orgasmo genital é que possibilita a sublimação (dessexualização) dos desejos pré-genitais. O que determina a possibilidade de o ego conseguir chegar à solução feliz desta ordem não é fácil dizer.
Caracteriza-se a sublimação por:
a)Inibição do objetivo
b)Dessexualização
c)Absorção completa de um instinto nas respectivas eqüelas
d)Alteração dentro do ego; qualidades todas estas que também se vêem nos resultados de umas tantas identificações, qual seja, no processo de formação do superego.
O fato empírico das sublimações, sobretudo as que se originam na infância, dependerem da presença de modelos, de incentivos que o ambiente forneça direta ou indiretamente, corrobora a asserção de Freud no sentido de que a sublimação talvez se relacione intimamente com a identificação. Mais ainda: Os casos de transtorno da capacidade de sublimar mostraram que esta incapacidade corresponde a dificuldades na promoção de identificações. Tal qual ocorre com certas identificações, também as sublimações são capazes de opor-se e se desfazerem, com êxito maior ou menor, certos impulsos destrutivos infantis; mas também podem satisfazer, de maneira distorcida, estes mesmos impulsos destrutivos; de algum modo, toda fixação artística de um processo natural “mata” este processo. É possível ver precursores das sublimações em certas brincadeiras infantis, nas quais os desejos sexuais se satisfazem por uma forma “dessexualizada” em seguida a certa distorção da finalidade ou do objeto; e as identificações também são decisivas neste tipo de brincadeiras.
Varia muito a extensão da divisão do objetivo na sublimação. Há casos em que a diversão se limita a inibição do objetivo; a pessoa que haja feito a sublimação faz, precisamente, aquilo que o seu instinto exige que faça, mas isso depois que o instinto se dessexualize e se subordine à organização do ego. Noutros tipos de sublimação, ocorrem transformações de alcance muito maior. É até possível que certa atividade de direção oposta ao instinto original substitua, de fato, este último. Certas reações de nojo, habituais entre as pessoas civilizadas, sem vestígio das tendências instintivas infantis contra as quais se desenvolveram originalmente, incluem-se nesta categoria.O que ocorre, então, é idêntico ao que Freud chamou transformação no contrário; uma vez completada toda a força de um instinto opera na direção contrária.
Repressão
É a operação psíquica que pretende fazer desaparecer, da consciência, impulsos ameaçadores, sentimentos, desejos, ou seja, conteúdos desagradáveis, ou inoportunos. Em sentido amplo, é uma operação psíquica que tende a fazer desaparecer da consciência um conteúdo desagradável ou inoportuno: idéia, afeto, etc. Neste sentido, o recalque seria uma modalidade especial de repressão.
Em sentido mais restrito, designa certas operações do sentido amplo, diferentes do recalque:
a)Ou pelo caráter consciente da operação e pelo fato de o conteúdo reprimido se tornar simplesmente pré-consciente e não inconsciente;
b)Ou, no caso da repressão de um afeto, porque este não é transposto para o inconsciente, mas inibido, ou mesmo suprimido.
Racionalização
É uma forma de substituir por boas razões uma determinada conduta que exija explicações, de um modo geral, da parte de quem a adota. Os Psicanalistas, em tom jocoso, dizem que racionalização é uma mentira inconsciente que se põe no lugar do que se reprimiu.É um processo pelo qual o sujeito procura apresentar uma explicação coerente do ponto de vista lógico, ou aceitável do ponto de vista moral, para uma atitude, uma ação, uma idéia, um sentimento, etc., cujos motivos verdadeiros não percebe; fala-se mais especialmente da racionalização de um sintoma, de uma compulsão defensiva, de uma formação reativa. A racionalização intervém também no delírio, resultando numa sistematização mais ou menos acentuada.
A racionalização é um processo muito comum, que abrange um extenso campo que vai desde o delírio ao pensamento normal.Como qualquer comportamento pode admitir uma explicação racional, muitas vezes é difícil decidir se esta é falha ou não. Em especial no tratamento psicanalítico encontraríamos todos os intermediários entre dois extremos; em certos casos é fácil demonstrar ao paciente o caráter artificial das motivações invocadas e incitá-lo assim a não se contentar com elas; em outros, os motivos racionais são particularmente sólidos (os analistas conhecem as resistências que a “alegação da realidade”, por exemplo, pode simular), mas mesmo assim pode ser útil colocá-los “entre parênteses” para descobrir as satisfações ou as defesas inconscientes que a eles se juntam. Como exemplo do primeiro caso encontraremos racionalizações de sintomas, neuróticos ou perversos (comportamento homossexual masculino explicado pela superioridade intelectual e estética do homem, por exemplo) ou compulsões defensivas (ritual alimentar explicado por preocupações de higiene, por exemplo).

Projeção
Manifesta-se quando o Ego não aceita reconhecer um impulso inaceitável do Id e o atribui a outra pessoa.É o caso do menino que gostaria de roubar frutas do vizinho sem, entretanto ter coragem para tanto, e diz que soube que um menino, na mesma rua, esteve tentando pular o muro do vizinho.
Termo utilizado num sentido muito geral em neurofisiologia e em psicologia para designar a operação pela qual um fato neurológico ou psicológico é deslocado e localizado no exterior, quer passando do centro para a periferia, quer do sujeito para o objeto. No sentido propriamente psicanalítico, operação pela qual o sujeito expulsa de si e localiza no outro - pessoa ou coisas - qualidades, sentimentos, desejos e mesmo “objetos” que ele desconhece ou recusa nele. Trata-se aqui de uma defesa de origem muito arcaica, que vamos encontrar em ação particularmente na paranóia, mas também em modos de pensar “normais”, como a superstição.

Deslocamento
É um processo psíquico através do qual o todo é representado por uma parte ou vice-versa.Também pode ser uma idéia representada por uma outra, que, emocionalmente, esteja associada à ela. Esse mecanismo não tem qualquer compromisso com a lógica. É o caso de alguém que tendo tido uma experiência desagradável com um policial, reaja desdenhosamente, em relação a todos os policiais.
É muito corrente nos sonhos, onde uma coisa representa outra. Também se manifesta na Transferência, fazendo com que o indivíduo apresente sentimentos em relação a uma pessoa que, na verdade, lhe representa uma outra do seu passado.
Fato de a importância, o interesse, a intensidade de uma representação ser suscetível de se destacar dela para passar a outras representações originariamente pouco intensas, ligadas à primeira por uma cadeia associativa.Esse fenômeno, particularmente visível na análise do sonho, encontra-se na formação dos sintomas psiconeuróticos e, de um modo geral, em todas as formações do inconsciente. A teoria psicanalítica do deslocamento apela para a hipótese econômica de uma energia de investimento suscetível de se desligar das representações e de deslizar por caminhos associativos.
O “livre” deslocamento desta energia é uma das principais características do modo como o processo primário rege o funcionamento do sistema inconsciente.

Identificação
É o processo psíquico por meio do qual um indivíduo assimila um aspecto, uma característica de outro, e se transforma, total ou parcialmente, apresentando-se conforme o modelo desse outro. A personalidade constitui-se e diferencia-se por uma série de identificações.
Freud descreve como característico do trabalho do sonho o processo que traduz a relação de semelhança, o “tudo como se”, por uma substituição de uma imagem por outra ou “identificação”. A identificação não tem aqui valor cognitivo: é um processo ativo que substitui uma identidade parcial ou uma semelhança latente por uma identidade total.
Regressão
É o processo psíquico em que o Ego recua, fugindo de situações conflitivas atuais, para um estágio anterior. É o caso de alguém que depois de repetidas frustrações na área sexual, regrida, para obter satisfações, à fase oral, passando a comer em excesso. Considerada em sentido tópico, a regressão se dá, de acordo com Freud, ao longo de uma sucessão de sistemas psíquicos que a excitação percorre normalmente segundo determinada direção.No seu sentido temporal, a regressão supõe uma sucessão genética e designa o retorno do sujeito a etapas ultrapassadas do seu desenvolvimento (fases libidinais, relações de objeto, identificações, etc.) No sentido formal, a regressão designa a passagem a modos de expressão e de comportamento de nível inferior do ponto de vista da complexidade, da estruturação e da diferenciação.
A regressão é uma noção de uso muito freqüente em psicanálise e na psicologia contemporânea; é concebida, a maioria das vezes, como um retorno a formas anteriores do desenvolvimento do pensamento, das relações de objeto e da estruturação do comportamento.
Freud é levado então a diferenciar o conceito de regressão, como o demonstra esta passagem acrescentada em 1914 em três espécies de regressões:
a)Tópica, no sentido do esquema do aparelho psíquico.A regressão tópica é particularmente manifestada no sonho, onde ela prossegue até o fim.Encontra-se em outros processos patológicos em que é menos global (alucinação) ou mesmo em processos normais em que vai menos longe (memória).b)Temporal, em que são retomadas formações psíquicas mais antigas.c)Formal, quando os modos de expressão e de figuração habituais são substituídos por modos primitivos. Estas três formas de regressão, na sua base, são apenas uma, e na maioria dos casos coincidem, porque o que é mais antigo no tempo é igualmente primitivo na forma e, na tópica psíquica, situa-se mais perto da extremidade perceptiva.
Isolamento
É um processo psíquico típico da neurose obsessiva, que consiste em isolar um comportamento ou um pensamento de tal maneira que as suas ligações com os outros pensamentos, ou com o autoconhecimento, ficam absolutamente interrompidas, já que foram ( os pensamentos, os comportamentos), completamente excluídos do consciente.
Entre os processos de isolamento, citemos as pausas no decurso do pensamento, fórmulas, rituais, e,de um modo geral, todas as medidas que permitem estabelecer um hiato na sucessão temporal dos pensamentos ou dos atos. Certos doentes defendem-se contra uma idéia, uma impressão, uma ação, isolando-as do contexto por uma pausa durante a qual “…nada mais tem direito a produzir-se, nada é qualificada de mágica por Freud; aproxima-a do processo normal de concentração no sujeito que procura não deixar que o seu pensamento se afaste do seu objeto atual. O isolamento manifesta-se em diversos sintomas obsessivos; nós o vemos particularmente em ação no tratamento, onde a diretriz da associação livre, por lhe se oposta, coloca-o em evidência (sujeitos que separam radicalmente a sua análise da sua vida, ou determinada seqüência de idéias do conjunto da sessão, ou determinada representação do seu contexto ideal afetivo).
Freud reduz, em última análise, a tendência para o isolamento a um modo arcaico de defesa contra a pulsão, a interdição de tocar, uma vez que “… o contato corporal é a finalidade imediata do investimento de objeto, quer o agressivo quer o terno”. Nesta perspectiva, o isolamento surge como “… uma supressão da possibilidade de contato, um meio de subtrair uma coisa ao contato; do mesmo modo, quando o neurótico isola uma impressão ou uma atividade por pausa, dá-nos simbolicamente a entender que não permitirá que os pensamentos que lhes dizem respeito entrem em contato associativo com outros”. Na realidade, pensamos que seria interessante reservar o termo isolamento para designar um processo específico de defesa que vai da compulsão a uma atitude sistemática e concentrada, e que consiste numa ruptura das conexões associativas de um pensamento ou de uma ação, especialmente com o que os precede e os segue no tempo.
Formação Reativa
É um processo psíquico que se caracteriza pela adoção de uma atitude de sentido oposto a um desejo que tenha sido recalcado, constituindo-se, então, numa reação contra ele. Uma definição: é o processo psíquico, por meio do qual um impulso indesejável é mantido inconsciente, por conta de uma forte adesão ao seu contrário. Muitas atitudes neuróticas existem que são tentativas evidentes de negar ou reprimir alguns impulsos, ou de defender a pessoa contra um perigo instintivo. São atitudes tolhidas rígidas, que obstam a expressão de impulsos contrários, os quais, no entanto, de vez em quando, irrompem por diversos modos. Nas peculiaridades desta ordem, a psicanálise, psicologia “desmascaradora” que é, consegue provar que a atitude oposta original ainda está presente no inconsciente.Chamam-se formações reativas estas atitudes opostas secundárias. As formações reativas representam mecanismo de defesa separado e independente? Dão mais impressão de constituir a conseqüência e reafirmação de uma repressão estabelecida. Quando menos, contudo, significam certo tipo de repressão que é possível distinguir de outras repressões. Digamos: É um tipo de repressão em que a contracatexia é manifesta e que, portanto, tem êxito no evitar de atos repressivos muito repetidos de repetidos de repressão secundária. As formações reativas evitam repressões secundárias pela promoção de modificação definitiva, “uma vez por todas”, da personalidade. O indivíduo que haja constituído formações reativas não desenvolve certos mecanismos de defesa de que se sirva ante a ameaça de perigo instintivo; modificou a estrutura da sua personalidade, como se este perigo estivesse sem cessar presente, de maneira que esteja pronto sempre que ocorra.
Substituição
Processo pelo qual um objeto valorizado emocionalmente, mas que não pode ser possuído, é inconscientemente substituído por outro, que geralmente se assemelha ao proibido. É uma forma de deslocamento.
Fantasia
É um processo psíquico em que o indivíduo concebe uma situação em sua mente, que satisfaz uma necessidade ou desejo, que não pode ser, na vida real, satisfeito. É um roteiro imaginário em que o sujeito está presente e que representa, de modo mais ou menos deformado pelos processos defensivos, a realização de um desejo e, em última análise, de um desejo inconsciente.A fantasia apresenta-se sob diversas modalidades:
a)Fantasias conscientes ou sonhos diurnos.
b)Fantasias inconscientes como as que a análise revela, como estruturas subjacentes a um conteúdo manifesto.
c)Fantasias originárias.


Compensação
É o processo psíquico em que o indivíduo se compensa por alguma deficiência, pela imagem que tem de si próprio, por meio de um outro aspecto que o caracterize, que ele, então, passa a considerar como um trunfo.
Expiação
É o processo psíquico em que o indivíduo quer pagar pelo seu erro imediatamente.
Negação
A tendência a negar sensações dolorosas é tão antiga quanto o próprio sentimento de dor. Nas crianças pequenas, é muito comum a negação de realidades desagradáveis, negação que realiza desejos e que simplesmente exprime a efetividade do princípio do prazer. A capacidade de negar pares desagradáveis da realidade é a contrapartida da “realização alucinatória dos desejos”. Anna Freud chamou este tipo de recusa do reconhecimento do desprazer em geral “pré-estádios da defesa”.

Introjeção
Originalmente, a idéia de engolir um objeto exprime afirmação; e como tal é o protótipo de satisfação instintiva, e não de defesa contra os instintos. No estádio do ego prazeroso purificado, tudo quanto agrada é introjetado. Em última análise, todos os objetos sexuais derivam de objetivos de incorporação. Do mesmo passo, a projeção é o protótipo da recuperação daquela onipotência que foi projetada para os adultos. Contudo, a incorporação, embora exprima “amor”, destrói objetivamente os objetos como tais como coisas independentes do mundo exterior. Percebendo este fato, o ego aprende a usar a introjeção para fins hostis como executora de impulsos destrutivos e também como modelo de um mecanismo definido de defesa. A incorporação é o objetivo mais arcaico dentre os que se dirigem para um objeto. A identificação, realizada através da introjeção, é o tipo mais primitivo de relação com os objetos.


















Fragmentos da análise de uma
“História de uma Neurose Infantil”
O Homem dos Lobos se refere a Serguei Constantinovitch Pankejeff (1887-1979). Este é o mais elaborado e sem dúvida o mais importante de todos os casos clínicos de Freud. Terceiro e último grande tratamento psicanalítico, depois de Dora (Ida Bauer) e do Homem dos Ratos (Ernst Lanzer). Essa análise foi a mais longa das três, começou em fevereiro de 1910, onde o jovem e rico russo, dirigiu-se a Freud para ser analisado. Sua primeira etapa de tratamento durou daquela data até julho de 1914, quando Freud considerou inicialmente o caso encerrado. Começou a escrever o caso clínico em outubro do mesmo ano e concluiu-o em princípios de novembro. Os membros da família tinham vários casos de doenças celebrais. O tio Pedro sofria de paranóia, o tio Nicolau quis raptar a noiva de um de seus filhos, um primo foi internado num manicômio com delírios de perseguição. Em 1905, sua irmã Anna suicidou-se e, dois anos depois, foi a vez de seu pai tirar a própria vida. Nessa época, Serguei freqüentava o ginásio. Conheceu uma mulher do povo, Matrona, com quem contraiu gonorréia. Mergulhou então em acessos freqüentes de depressão, que em pouco tempo, de sanatórios para hospícios e de clínicas de repouso para termas medicinais, levaram-no a se transformar num doente ideal para o saber psiquiátrico do fim do século.Depois de Serguei sobreviver às duas guerras mundiais, redigiu uma autobiografia que analisava seu próprio caso, revelando sua verdadeira identidade. Após o pós-guerra retomou para uma “segunda etapa” do tratamento, pois não se considerava “curado” com a primeira análise com Freud. Mais tarde continuou a análise com uma aluna de Freud (Ruth Mack Brunswick). Instalado em Viena depois da derrota do nazismo, foi sustentado pelo movimento psicanalítico. Sendo analisado a cada verão por Kurt Eissler, tratado por Wilhelm Solms-Rödelheim e, finalmente, ajudado por Muriel Gardiner na redação de suas memórias, tornou-se um personagem mítico: mais o “Homem dos Analistas” do que o “Homem dos Lobos”, símbolo, afinal, do caráter “interminável” da análise freudiana.
A primeira evidência do interesse de Freud pelo caso foi um parágrafo que apareceu, com a sua assinatura, no início do outono de 1912, estimulado pelo sonho do lobo, que é motivo central do caso clínico e Freud relata o seguinte:“Ficaria satisfeito se todos os meus colegas que se preparam para ser analistas coligissem e analisassem cuidadosamente quaisquer sonhos de seus pacientes cuja interpretação justifique a conclusão de que aqueles que os tiveram tenham sido testemunhas de um ato sexual nos primeiros anos de vida. Uma sugestão é sem dúvida suficiente para tornar evidente que tais sonhos são de um valor muito especial, em mais de um aspecto. Apenas esses sonhos podem, é claro, ser considerados como indicativos de que ocorreram na infância, e são lembrados a partir desse período”. Aos olhos de Freud, o significado primário deste caso clínico na época da sua publicação era claramente o apoio que proporcionava para as suas críticas a Adler e, mais especificamente, a Jung. Havia ali evidência conclusiva para refutar qualquer negação da sexualidade infantil. Havia, por exemplo, a relação entre as ‘cenas primárias’ e as ‘fantasias primitivas’, que conduziu diretamente ao obscuro problema da possibilidade de que o conteúdo mental da fantasias primitivas pudesse ser herdado. Parece provável que o material ‘canibalístico’ revelado nessa análise tenha desempenhado um papel importante na preparação do caminho para algumas das mais significativas das teorias de que Freud se ocupava nesse período: a interconexões entre incorporação, identificação, a formação de um ideal do ego, o sentimento de culpa e os estados patológicos de depressão. Algumas dessas teorias já haviam sido expressas no último ensaio de Totem e Tabu. Talvez a principal descoberta clínica seja a de revelar a evidência do papel determinante desempenhado na neurose do paciente pelos seus impulsos femininos primários. Seu marcado grau de bissexualidade era apenas a confirmação de pontos de vista há muito defendidos por Freud, que datavam da época de sua amizade com Fliess. Nos seus escritos subseqüentes, porém, Freud deu ainda mais ênfase ao fato da ocorrência universal da bissexualidade e da existência de um complexo de Édipo ‘invertido’ ou ‘negativo’.


Finalmente, talvez seja legítimo chamar a atenção para a extraordinária habilidade literária com que Freud expôs o caso. Estava diante da tarefa pioneira de fornecer um relato científico de eventos psicológicos de novidade e complexidade jamais sonhadas. O resultado é um trabalho que não apenas evita os perigos de confusão e obscuridade, mas também prende a fascinada atenção do leitor do princípio ao fim.
. O sonho com lobos.
“Sonhei que era noite e que eu estava deitado na cama. (Meu leito tem o pé da cama voltado para a janela: em frente da janela havia uma fileira de velhas nogueiras. Sei que era inverno quando tive o sonho, e de noite.) De repente, a janela abriu-se sozinha e fiquei aterrorizado ao ver que alguns lobos brancos estavam sentados na grande nogueira em frente da janela. Havia seis ou sete deles. Os lobos eram muito brancos e pareciam-se mais com raposas ou cães pastores, pois tinham caudas grandes, como as raposas, e orelhas empinadas, como cães quando prestam atenção a algo. Com grande terror, evidentemente de ser comido pelos lobos, gritei e acordei. Minha babá correu até minha cama, para ver o que me havia acontecido. Levou muito tempo até que me convencesse de que fora apenas um sonho; tivera uma imagem tão clara e vívida da janela a abrir-se e dos lobos sentados na árvore. Por fim acalmei-me, senti-me como se houvesse escapado de algum perigo e voltei a dormir. A única ação no sonho foi à abertura da janela, pois os lobos estavam sentados muito quietos e sem fazer nenhum movimento sobre os ramos da árvore, à direta e à esquerda do tronco, e olhavam para mim. Era como se tivessem fixado toda a atenção sobre mim. — Acho que foi meu primeiro sonho de ansiedade. Tinha três, quatro, ou, no máximo, cinco anos de idade na ocasião. Desde então, até contar onze ou doze anos, sempre tive medo de ver algo terrível em meus sonhos” . Ele acrescentou um desenho da árvore com os lobos, que confirmava sua descrição .


Interpretação
Sempre vinculara este sonho à recordação de que, durante esses anos de infância, tinha um medo tremendo da figura de um lobo num livro de contos de fadas. Sua irmã mais velha, que lhe era superior, costumava apoquentá-lo segurando esta figura específica na sua frente, sob qualquer pretexto, para que ele ficasse aterrorizado e começasse a gritar. Na figura, o lobo achava-se ereto, dando um passo com uma das patas, com as garras estendidas e as orelhas empinadas. Achava que a figura deveria ter sido uma ilustração da história do “Chapeuzinho Vermelho”. Por que os lobos eram brancos? Isto fê-lo pensar nas ovelhas, grandes rebanhos das quais eram mantidos nas vizinhanças da propriedade. O pai ocasionalmente o levava a visitar esses rebanhos e, todas as vezes que isso acontecia, ele se sentia muito orgulhoso e feliz. Posteriormente — segundo indagações feitas, pode facilmente ter sido pouco antes da época do sonho — irrompeu uma epidemia entre as ovelhas. O pai mandou buscar um seguidor de Pasteur, que vacinou os animais, mas após a inoculação morreram ainda mais delas que antes. Como os lobos apareceram na árvore? Isto fê-lo lembrar-se de uma história que ouvira o avô contar. A história dizia assim: um alfaiate estava sentado trabalhando em seu quarto, quando a janela se abriu e um lobo pulou para dentro. O alfaiate perseguiu-o com seu bastão — não (corrigiu-se), apanhou-o pela cauda e arrancou-a fora, de modo que o lobo fugiu correndo, aterrorizado. Algum tempo mais tarde, o alfaiate foi até a floresta e subitamente viu uma alcatéia de lobos vindo em sua direção; então trepou numa árvore para fugir-lhes. A princípio, os lobos ficaram perplexos; mas o aleijado, que se achava entre eles e queria vingar-se do alfaiate, propôs que trepassem uns sobre os outros, até que o último pudesse apanhá-lo. Ele próprio — tratava-se de um animal velho e vigoroso — ficaria na base da pirâmide. Os lobos fizeram como ele sugerira, mas o alfaiate reconhecera o visitante a que havia castigado e de repente gritou, como fizera antes: “Apanhem o cinzento pela cauda!” O lobo sem rabo, aterrorizado pela recordação, correu, e todos os outros desmoronaram.Nesta história aparece a árvore sobre a qual os lobos se achavam sentados no sonho; mas ela contém também uma alusão inequívoca ao complexo de castração. O lobo velho tivera a cauda arrancada pelo alfaiate. As caudas de raposa dos lobos do sonho eram provavelmente compensações por esta falta de cauda.
Por que havia seis ou sete lobos? Não parecia haver resposta para esta pergunta, até eu levantar uma dúvida sobre saber se a figura que o assustava estava vinculada à história de “Chapeuzinho Vermelho”. Este conto de fadas só oferece oportunidade para duas ilustrações — Chapeuzinho Vermelho encontrando-se com o lobo na floresta e a cena em que o lobo se deita na cama, com o barrete de dormir da avó. Teria de haver, portanto, algum outro conto de fadas por trás de sua recordação da figura. Ele logo descobriu que só podia ser a história de “O Lobo e os Sete Cabritinhos”. Nesta, ocorre o número sete, e também o número seis, pois o lobo só comeu seis dos cabritinhos, enquanto que o sétimo se escondeu na caixa do relógio. O branco também nela aparece, pois o lobo fizera branquear sua pata no padeiro, após os cabritinhos haverem-no reconhecidos, em sua primeira visita, pela pata cinzenta. Além disso, os dois contos de fadas possuem muito em comum. Em ambos existe o comer, a abertura da barriga, a retirada das pessoas que haviam sido comidas e sua substituição por pesadas pedras, e, finalmente, em ambas o lobo mau perece. Além disso tudo, na história dos cabritinhos aparece a árvore. O lobo deitou-se sob uma árvore, após a refeição, e roncou.Numa outra ocasião, uma associação que lhe ocorreu subitamente levou-nos um passo adiante em nossa compreensão do sonho: ‘A árvore era uma árvore de Natal.’ Sabia agora que tivera o sonho pouco antes do Natal e na expectativa desse acontecimento. Uma vez que o dia de Natal era também o do seu aniversário, tornou-se então possível estabelecer com certeza a data do sonho e da mudança nele, que procedia do sonho. Foi imediatamente antes do seu quarto aniversário. Fora para a cama, então, numa expectativa tensa do dia que lhe deveria trazer uma dupla quantidade de presentes. Sabemos que, em tais circunstâncias, uma criança pode facilmente antecipar a realização dos seus desejos. Assim, já era Natal em seu sonho; o conteúdo do sonho mostrava-lhe o seu presente de Natal, os presentes que seriam seus pendurados na árvore. Mas em vez de presentes, estes se haviam transformado em lobos, e o sonho finalizava com ele sendo dominado pelo medo de ser comido pelo lobo (provavelmente seu pai) e fugindo para refugiar-se nos braços da babá.
O menino vê uma relação sexual.
Entrou em atividade naquela noite, vindo do caos dos traços de memória inconscientes do sonhador, foi o quadro de uma cópula entre os pais, cópula em circunstâncias que não eram inteiramente habituais e que favoreciam particularmente a observação. Em primeiro lugar, a idade da criança à data da observação foi estabelecida aproximadamente em um ano e meio. Na época estava sofrendo de malária e tinha um ataque todos os dias a uma determinada hora. A partir dos dez anos de idade esteve sujeito, de vez em quando, a crises de depressão, que costumavam sobrevir à tarde e atingiram o seu ponto culminante por volta das cinco horas. Esse sintoma ainda existia na época do tratamento psicanalítico. As freqüentes crises de depressão tomaram o lugar dos anteriores ataques de febre ou abatimento; cinco horas ou era a hora da febre mais alta, ou da observação do coito, a não ser que às duas horas tivessem coincidido. É provável que justamente por causa dessa doença ele estivesse no quarto dos pais. A doença, cuja ocorrência é também corroborada pela tradição direta, torna razoável referir o evento ao verão e, de vez que o menino nascera no dia de Natal, presumir que sua idade fosse n + 1 ½ anos. Ele estava então dormindo no seu berço, no quarto dos pais, e acordou, talvez por causa da febre que subia, à tarde, possivelmente às cinco horas, a hora que depois seria marcada pela depressão. Isso está de acordo com nossa suposição de que era um dia quente de verão, se presumimos que os pais se haviam recolhido, meio despidos, para uma sesta. Quando o menino acordou, presenciou um coito a tergo [por trás], repetido três vezes, podia ver os genitais da mãe, bem como o órgão do pai; e compreendeu o processo, assim como o seu significado. Por fim interrompeu a relação sexual dos pais de uma maneira que será exposta adiante. As dúvidas quanto à sua probabilidade poderão girar em torno de três pontos: se uma criança na tenra idade de um ano e meio poderia estar numa posição de absorver a percepção de um processo tão complicado e preservá-la em seu inconsciente; em segundo lugar, se é possível, aos quatro anos de idade, que uma revisão transferida das impressões assim recebidas penetre no entendimento; e, finalmente, se qualquer procedimento poderia trazer para a consciência, coerente e convincentemente, os detalhes de uma cena dessa natureza, experimentada e compreendida em tais circunstâncias. Por estas últimas quero dizer as posturas que ele viu os pais adotarem — o homem ereto e a mulher curvada, como um animal. Já sabemos que durante seu período de ansiedade, a irmã costumava aterrorizá-lo com uma figura de um livro de contos infantis, na qual o lobo era mostrado em posição vertical, com os pés em posição de movimento, as garras a descoberto e as orelhas em pé.
Durante o tratamento, ele se dedicou com perseverança incansável à tarefa de vasculhar os sebos até encontrar o livro ilustrado da sua infância, reconhecendo o seu mau espírito numa ilustração da história de ‘O Lobo e os Sete Cabritinhos’. Achou que a postura do lobo nessa gravura poderia ter-lhe recordado a do pai durante a cena primária. Em todo caso, a ilustração tornou-se o ponto de partida para manifestações posteriores da ansiedade. Certa vez, quando tinha sete ou oito anos, foi informado de que no dia seguinte chegaria um novo tutor para ele. Nessa noite, sonhou com o tutor na forma de um leão que vinha em direção à sua cama, rugindo ruidosamente e com a postura do lobo na gravura; e o outra vez acordou em estado de ansiedade. A fobia ao lobo fora superada nessa época, de modo que estava livre para escolher um novo animal que causasse ansiedade e, nesse último sonho, estava reconhecendo o tutor como um substituto do pai. Nos últimos anos de sua infância, todos os seus tutores e mestres desempenharam o papel do pai, dotado com a influência do pai tanto para o bem como para o mal.Quando estava na escola secundária, o destino proporcionou-lhe uma oportunidade notável de reviver a sua fobia ao lobo e de usar a relação que estava por trás dessa fobia como ocasião para graves inibições. O professor que ensinava latim chama-se Wolf. Desde o começo sentiu-se intimidado pelo professor, e este certa vez repreendeu-o severamente por haver cometido um erro estúpido num texto traduzido do latim.
A partir de então não conseguiu livrar-se de um medo paralisante em relação a esse professor, o que em breve se estendeu a outros mestres. O lobo, na verdade, ainda era seu pai. O primeiro ‘sintoma transitório’ que o paciente produziu durante o tratamento retornou uma vez mais à fobia ao lobo e ao conto de fadas dos ‘Sete Cabritinhos’. Na sala em que as primeiras sessões foram realizadas havia um grande relógio de pé, defronte ao paciente, que ficava no sofá sem voltar o rosto para mim. Impressionava-me o fato de que, de vez em quando, ele se virava na minha direção, olhava-me de uma maneira bastante amistosa, como que para me aplacar, e então afastava de mim o olhar e fixava-o no relógio. Na ocasião eu achava que, dessa forma, ele procurava mostrar-me que estava ansioso pelo fim da sessão. Muito tempo depois o paciente recordou-me essa cena de espetáculo mudo e deu-me uma explicação a respeito dela. Lembrava-se de que o mais novo dos sete cabritinhos escondeu-se na caixa do relógio de parede, enquanto os seis irmãos eram comidos pelo lobo. Assim, o que ele queria dizer era: ‘Seja bom para mim! Devo ficar com medo do senhor? O senhor vai devorar-me? Terei que me esconder do senhor na caixa do relógio, como o cabritinho mais novo?’As etapas na transformação do material; cena primária — história do lobo — conto dos ‘Sete Cabritinhos’, refletem o progresso dos pensamentos do sonhador durante a construção do sonho: ‘desejo de obter do pai satisfação sexual — a compreensão de que a castração era uma condição necessária para isso — medo do pai’. Somente neste ponto, acho eu, podemos considerar o sonho de ansiedade desse menino de quatro anos como estando exaustivamente explicado.
O sonho acabou em um estado de ansiedade, do qual não se recuperou até que teve a babá junto a si. Fugiu, portanto, do pai para ela. Sua ansiedade era um repúdio do desejo de obter do pai satisfação sexual — tendência à qual se deve a formação do sonho na sua cabeça. A forma assumida pela ansiedade, o medo de ‘ser devorado pelo lobo’, era apenas a transposição (como saberemos, regressiva) do desejo de copular com o pai, isto é, de obter satisfação sexual do mesmo modo que sua mãe. Seu último objetivo sexual, a atitude passiva em relação ao pai, sucumbiu à repressão, e em seu lugar apareceu o medo ao pai, sob a forma de uma fobia ao lobo.Desde a sedução, seu objeto sexual havia sido passivo, de ser tocado nos genitais; mas transformou-se, então, por regressão ao estádio mais primitivo da organização anal-sádica, no propósito masoquista de ser espancado ou castigado. Para ele era indiferente a questão de atingir esse objetivo com um homem ou com uma mulher. Descobriu a vagina e o significado biológico de masculino e feminino. Compreendia agora que ativo era o mesmo que masculino, ao passo que passivo era o mesmo que feminino. Seu objetivo sexual passivo deve ter sido, então, transformado em feminino, expressando-se como ‘ser copulado pelo pai’, em vez de ‘ser por ele espancado nos genitais ou no traseiro’. Esse objetivo feminino, no entanto, sujeitou-se à repressão e foi obrigado a deixar-se substituir pelo medo do lobo.
Para apreciação adequada da fobia aos lobos, acrescentaremos apenas que tanto o pai como a mãe transformou-se em lobos. Sua mãe assumiu o papel do lobo castrado, que deixava os outros subirem sobre ele; o pai assumiu o papel do lobo que subia. Entretanto, seu medo, conforme o ouvimos assegurar-nos, relacionava-se apenas com o lobo ereto, isto é, com seu pai. Ademais, deve-nos surpreender o fato de que o medo com o qual o sonho terminava tivesse um modelo na história do avô. Porque nesta, o lobo castrado, que deixara os outros treparem em cima, dele, tomava-se de medo tão logo era lembrado do fato da sua falta de cauda. Portanto, parece que ele se identificou com a mãe castrada durante o sonho, e agora lutava contra esse fato. Resumindo, um claro protesto da parte da sua masculinidade!
A Sublimação
Quando estava com quatro anos e meio de idade, e seu estado de irritabilidade e preocupação não havia ainda melhorado, a mãe determinou-se a familiarizá-lo com a história da Bíblia, na esperança de distraí-lo e animá-lo. Nesse sentido, foi bem-sucedida; a iniciação religiosa do menino deu fim à fase anterior, mas, ao mesmo tempo, fez com que os sintomas da ansiedade fossem substituídos por sintomas obsessivos. Até então não conseguia conciliar o sono facilmente porque tinha medo de ter maus sonhos, como o que tivera naquela noite antes do Natal; agora era obrigado, antes de ir para a cama, a beijar todas as imagens sagradas que havia no quarto, a dizer orações e a fazer incontáveis vezes o sinal-da-cruz, em si mesmo e sobre a sua cama.A sua infância ajusta-se agora, claramente, nos seguintes períodos: primeiro, o período que se estende até a sedução, aos três anos e um quarto, durante o qual teve lugar a cena primária; segundo, o período da alteração em seu caráter, até o sonho de ansiedade (quatro anos de idade); terceiro, o período da fobia animal, até a iniciação religiosa (quatro anos e meio); e daí em diante, o período da neurose obsessiva, até uma época posterior aos seus dez anos. Sua impertinência não desapareceu quando a ansiedade se instalou, e persistiu, com força lentamente decrescente, durante o período de piedade religiosa. Contudo, já não havia qualquer traço da fobia de lobos durante essa última fase. Em primeiro lugar, opôs-se tenazmente ao aspecto de sofrer na figura de Cristo e, depois, contra a sua história como um todo. Voltou seu descontentamento crítico contra Deus Pai. Se era todo-poderoso, então era culpa dele se os homens eram maus e atormentavam os outros e eram mandados para o Inferno por causa disso. Ele devia tê-los feito bons; Ele próprio era responsável por toda a maldade e todos os tormentos. Também fez objeções ao fato de que devemos voltar a outra face, se nos batem no lado direito, e ao fato de que Cristo desejara, na Cruz, que o cálice lhe pudesse ser tirado, bem como ao fato de que não ocorrera nenhum milagre para provar que era filho de Deus. Assim, sua perspicácia estava alerta, e era capaz de descobrir, com severidade e sem remorso, os pontos fracos da narrativa sagrada.
A essa crítica racionalista, porém, em breve juntaram-se ruminações e dúvidas, o que nos revela que nele também operavam impulsos ocultos. Uma das primeiras perguntas que fez à sua Nanya foi se Cristo também havia tido um traseiro. A babá respondeu-lhe que ele fora um deus e também um homem. Como homem, tivera e fizera as mesmas coisas que os outros homens. Isso não satisfez de modo algum o menino, mas ele conseguiu encontrar o seu próprio consolo, dizendo a si mesmo que o traseiro, na verdade, é apenas uma continuação das pernas. Mal conseguira pacificar seu medo de ter humilhado a figura sagrada, quando o temor novamente se acendeu ao surgir a questão de saber se Cristo também costumava defecar. Não se arriscou a fazer essa pergunta à piedosa babá, mas encontrou por si uma saída, e ela não poderia tê-la achado melhor. De vez que Cristo fizera vinho de nada, também podia transformar a comida em nada e, dessa forma, não precisava defecar.Só podemos fazer justiça à aparente complexidade da situação tendo em mente a coexistência de três tendências sexuais do menino em relação ao pai.

A partir da época do sonho, em seu inconsciente ele era homossexual e, em sua neurose, estava no nível do canibalismo; ao passo que a atitude anterior, masoquista, continuou a ser a dominante. O conhecimento que tinha então da história sagrada não lhe dava oportunidade de sublimar a sua atitude masoquista predominante em relação ao pai. O menino transformou-se em Cristo — o que se tornou particularmente fácil para ele em virtude da coincidência dos aniversários. Assim, transformou-se em algo grande e também (fato ao qual não foi dado o devido destaque) num homem. Surpreendemos um lampejo da sua atitude homossexual reprimida na dúvida em relação ao fato de Cristo ter um traseiro, pois essas ruminações não podem ter outro significado senão a questão de poder ele próprio ser usado pelo pai como uma mulher — como a mãe na cena primária. Quando chegamos à solução das outras idéias obsessivas, encontramos essa intervenção confirmada. Sua idéia de que era insultuoso relacionar a figura sagrada com tais insinuações, correspondia à repressão do seu homossexualismo passivo. Deus tratara o Filho áspera e cruelmente, mas não era melhor em relação aos homens; sacrificara o próprio Filho e ordenara a Abraão que fizesse o mesmo. Começou a temer Deus. Não via seu pai há muitos meses quando, um dia, sua mãe disse que ia levar as crianças à cidade e mostrar-lhes algo que muito lhes agradaria. Levou-os então a um sanatório e eles viram o pai outra vez; parecia doente e o menino sentiu muita pena dele. O pai era, assim, o protótipo de todos os aleijados, mendigos e gente miserável em cuja presença era obrigado a expirar; tal como o pai é o protótipo dos demônios que as pessoas vêem quando em estado de ansiedade, e das caricaturas desenhadas para escarnecer de alguém. Quando estava com dez anos, teve um tutor alemão, que em tempo obteve grande influência sobre ele. É muito instrutivo observar que toda a sua piedade estrita desapareceu, para não mais renascer, depois que percebeu e soube, através de conversas esclarecedoras com seu tutor, que este substituto paterno não dava qualquer importância às atividades pias, nem atribuía qualquer valor à verdade religiosa. Sua piedade sumiu junto com a dependência do pai, que foi então substituído por outro, mais sociável.Quando o tutor o desencorajou de fazer crueldades com os animaizinhos, ele, de fato, pôs um fim às suas malvadezas, mas não antes de ter mais uma vez cortado lagartas, para grande satisfação sua. Ainda se comportava da mesma maneira durante o tratamento psicanalítico, pois mostrava o hábito de produzir ‘reações negativas’ transitórias; toda vez que algo havia sido esclarecido de forma conclusiva, tentava contradizer o efeito por algum tempo, agravando o sintoma que havia sido elucidado. Via de regra, como sabemos, as crianças lidam com as proibições do mesmo modo. Quando são repreendidas por algo (por exemplo, por estarem fazendo um barulho insuportável), repetem-no uma vez mais depois da proibição, antes de parar. Dessa maneira, conseguem, ao mesmo tempo, parar aparentemente por vontade própria e desobedecer a proibição.
Sob a influência do tutor alemão, surgiu uma nova e melhor sublimação do sadismo do paciente, o qual, com a aproximação da puberdade, dominara o seu masoquismo. Entusiasmou-se por assuntos militares, por uniformes, armas e cavalos, usando-os para alimentar contínuos devaneios. Assim, sob a influência de um homem, libertara-se das suas atitudes passivas, encontrando-se, na época, em vias razoavelmente normais. Foi por efeito tardio da sua afeição pelo tutor, que o deixou pouco depois, que passou a preferir, em períodos posteriores de sua vida, as coisas alemãs (como, por exemplo, os médicos, os sanatórios, as mulheres) em vez daquelas que existiam na sua terra (representando o pai) — um fato que foi, incidentalmente, de grande vantagem para a transferência durante o tratamento. Houve um outro sonho, que pertence ao período anterior à sua emancipação do tutor, e que menciono porque foi esquecido até surgir durante o tratamento. Viu-se a si próprio montando um cavalo e perseguido por uma gigantesca lagarta. Reconheceu nesse sonho uma alusão a outro, anterior, do período que precedeu o tutor, o qual havíamos interpretado muito tempo antes. Nesse sonho anterior ele viu o Diabo, vestido de preto e na postura vertical com a qual o lobo e o leão, por sua vez, o haviam aterrorizado tanto. Ele estava apontando, com o dedo estendido, para uma lesma colossal. O paciente adivinhara prontamente que esse Diabo era o Demônio de um conhecido poema, e que o próprio sonho era uma versão de uma gravura muito popular, que representava o Demônio numa cena de amor com uma jovem. A lesma estava no lugar da mulher, sendo um perfeito símbolo sexual feminino. Guiados pelo gesto de apontar do Diabo, em breve conseguimos dar ao sonho o significado que o paciente esperava que alguém lhe desse, os últimos detalhes de informação que ainda estavam faltando ao enigma da relação sexual, tal como o pai lhe dera os primeiros na cena primária, muito tempo atrás. Não desenvolveu um amor pelo estudo, não mais mostrou a agudeza com a qual, com apenas cinco anos de idade, criticara e dissecara as doutrinas religiosas.
A repressão do seu superpoderoso homossexualismo, consumada durante o sonho de ansiedade, reservou esse importante impulso para o inconsciente, manteve-o dirigido para o objetivo original e retirou-o de todas as sublimações às quais é suscetível, em outras circunstâncias. Por esse motivo o paciente era destituído de todos os interesses sociais que dão à vida um conteúdo. Somente quando, durante o tratamento analítico, se tornou possível liberar seu homossexualismo agrilhoado, é que esse estado de coisas mostrou alguma melhora; e foi uma experiência das mais notáveis verificar como (sem qualquer conselho direto do médico) cada fragmento da libido homossexual que era libertado procurava alguma aplicação na vida, alguma ligação com os grandes interesses da humanidade.

O Complexo de Castração
No começo da análise, “o homem dos lobos” havia-me contado uma lembrança do período no qual sua impertinência costumava transformar-se subitamente em ansiedade. Ele estava tentando apanhar uma grande e bonita borboleta, com listras amarelas e enormes asas que acabavam em ponta — na verdade, um rabo de andorinha. De repente, quando a borboleta havia pousado sobre uma flor, ele foi presa de um pavoroso medo da criatura e fugiu aos gritos.
Muitos meses depois, em relação a algo inteiramente diverso, o paciente observou que o abrir e fechar das asas da borboleta, enquanto estava pousada na flor, dera-lhe uma estranha sensação. Parecera-lhe, conforme contou, como uma mulher abrindo as pernas, e as pernas tomavam então a forma de um V romano, que, como sabemos, era a hora à qual, na infância e mesmo até a época do tratamento, costumava cair num estado mental depressivo.Os elementos que faltavam podia ser facilmente supridos por outras fontes. Durante os primeiros meses do tratamento, contara-me como se apaixonara de repente, de maneira compulsiva, por uma camponesa, da qual, aos dezoito anos, contraíra a causa que precipitou a sua enfermidade de adulto. Ao contar-me isso, demonstrara uma má vontade fora do comum de dizer-me o nome da jovem. Foi um exemplo inteiramente isolado de resistência, já que, excluindo esse episódio, obedecia sem reservas à regra fundamental da análise. Declarou, no entanto, que a razão de se mostrar tão envergonhado de mencioná-lo era por se tratar de um nome caracteristicamente camponês e que nenhuma jovem bem nascida poderia jamais se chamar assim. Quando finalmente o nome surgiu, aconteceu ser Matrona, nome que tem sobre si uma auréola maternal. A vergonha era, evidentemente, deslocada. Não se envergonhava do fato de esses casos de amor serem invariavelmente com mulheres da mais humilde origem; envergonhava-se apenas do nome. Se acontecesse ter o caso com Matrona algo em comum com a cena de Grusha, então a vergonha teria que ser transferida de volta para esse episódio prematuro.
Esse material ajustava-se espontaneamente e servia para preencher as lacunas na lembrança que o paciente tinha da cena com Grusha. Quando viu a moça varrendo o chão, urinou na sala e ela replicou, sem dúvida por brincadeira, com uma ameaça de castração. Quando viu a moça empenhada em esfregar o chão, ajoelhada, com as nádegas projetando-se e as costas em posição horizontal, deparava outra vez com a postura que a mãe havia assumido na cena da cópula. Para ele, a moça transformou-se em sua mãe, foi presa de excitação sexual devido à ativação dessa imagem; e, como o pai (cuja ação ele só pode ter considerado, na ocasião, como a de urinar), comportou-se de modo masculino em relação a ela. Seu ato de urinar no chão foi, na realidade, uma tentativa de sedução, e a moça respondeu a esse ato com uma ameaça de castração, exatamente como se tivesse compreendido o que ele queria dizer.
Em outra ocasião ele estava passando pela aldeia que fazia parte do que viria a ser a granja da família (a segunda), quando viu uma camponesa ajoelhada à beira do açude, lavando roupa. Apaixonou-se pela moça instantaneamente e com irresistível violência, embora não tivesse podido ainda nem sequer dar um olhar rápido ao seu rosto. Pela sua postura e ocupação, ela havia tomado, para ele, o lugar de Grusha. Podemos ver agora como foi que a vergonha, que se relacionava adequadamente ao conteúdo da cena com Grusha, pôde ligar-se ao nome de Matrona.
Um outro acesso de paixão, que data de poucos anos antes, mostra ainda mais claramente a influência compulsiva da cena de Grusha. Havia muito tempo sentia-se atraído por uma jovem camponesa, que era criada da casa, mas conseguia manter-se afastado dela. Um dia, quando a encontrou sozinha numa das dependências da casa, deixou-se subjugar pelo amor. Achou-a ajoelhada no chão, a esfregá-lo, com um balde e uma escova a seu lado — na verdade, exatamente como tinha visto a moça na sua infância. De vez que a cena de Grusha fora assimilada — a primeira experiência da qual podia realmente lembrar-se, e da qual se lembrara sem quaisquer conjecturas ou intervenção de minha parte —, o problema do tratamento tinha toda a aparência de estar resolvido. A partir daquele momento não houve mais resistência; tudo o que restava fazer era coletar e coordenar. Pareceu, então, que seu medo da borboleta era, em todos os aspectos, análogo ao medo do lobo; em ambos os casos eram um medo da castração, que se referia, para começar, à pessoa que primeiro proferira a ameaça de castração, mas foi depois transposta para outra pessoa, a quem se destinava a ligar-se, de acordo com o precedente filogenético. A cena com Grusha ocorre quando o paciente tinha dois anos e meio, mas o episódio de ansiedade com a borboleta amarela foi certamente posterior ao sonho de ansiedade. Era fácil entender como a tardia compreensão, por parte do paciente, da possibilidade de castração fizera aflorar retrospectivamente a ansiedade na cena com Grusha.A análise seria insatisfatória se deixasse de explicar a frase usada pelo paciente para resumir os problemas dos quais se queixava. O mundo, disse ele, estava oculto dele por um véu que só foi rasgado numa situação: no momento em que, como resultado de um edema, uma evacuação intestinal passou pelo seu ânus. Sentiu-se, então, bem outra vez e, por um período muito curto, viu o mundo claramente. A interpretação desse ‘véu’ progrediu com tanta dificuldade quanto a que encontramos no esclarecimento do medo que teve da borboleta. Nem ele se manteve apegado ao véu.
Não foi senão pouco antes de concluir o tratamento que se lembrou de que lhe haviam dito que nascera com um âmnio. Por esse motivo, sempre se considerara uma criança especial, com sorte, a quem nenhuma desgraça podia sobrevir. Não perdeu essa convicção até que foi forçado a compreender que a sua infecção gonorréica constituía um sério dano para o seu corpo. O golpe foi demais para o seu narcisismo e ele desmoronou. Pode-se dizer que, ao fazê-lo, estava repetindo um mecanismo que já antes colocara em ação. Porque sua fobia de lobos irrompera quando se achou diante do fato de que a castração era algo possível; e ele classificou claramente a gonorréia como castração.O desejo de nascer do pai (como ele acreditara, no início, que fosse o caso), o desejo de ser sexualmente satisfeito pelo pai, o desejo de presenteá-lo com uma criança — e tudo isso ao preço da sua própria masculinidade, expresso na linguagem do erotismo anal —, esses desejos completam o círculo da sua fixação no pai. Neles o homossexualismo encontrou a sua mais nova e íntima expressão.
A primeira, a fantasia do útero, origina-se com freqüência (como no presente caso) de uma ligação com o pai. Há um desejo de estar dentro do útero da mãe para substituí-la durante as relações sexuais — para tomar o lugar dela em relação ao pai. A fantasia do renascimento, por outro lado, e quase sempre, com toda a probabilidade, um substituto abrandado (um eufemismo, poder-se-ia dizer) para a fantasia da relação incestuosa com a mãe; para utilizar uma expressão de Silberer, é uma expressão anagógica dessa fantasia.
Há um desejo de voltar a uma situação na qual a pessoa estava nos genitais de sua mãe; e, em relação a isso, o homem identifica-se com seu próprio pênis e usa-o para representar-se. Dessa forma, as duas fantasias revelam-se como contrapartida uma da outra: dão expressão, conforme a atitude do sujeito seja feminina ou masculina, ao desejo de relacionamento sexual com o pai ou com a mãe. Não podemos afastar a possibilidade de que, na queixa feita pelo nosso paciente e na condição necessária estabelecida para a sua recuperação, as duas fantasias, ou seja, os dois desejos incestuosos, estejam unidos.


A Alucinação do Dedo Cortado
Ficara muito rico, graças a heranças do pai e do tio; era óbvio que dava grande importância a que o tomassem por rico e era suscetível nesse ponto, sentindo-se magoado se o subestimavam nesse aspecto. Ainda assim, não avaliava as outras pessoas pelo dinheiro e, pelo contrário, mostrava-se em diversas ocasiões modesto, prestimoso e generoso. O dinheiro, na verdade, saíra do seu controle consciente e tinha, para ele, um significado bastante diferente.
O modo pelo qual ele se consolou pela perda da irmã, a qual se tornara a sua companheira mais chegada nos últimos anos de vida, com o pensamento de que não teria, então, que repartir com ela a herança dos pais. Após a morte do pai, as posses deixadas foram divididas entre ele e sua mãe. A mãe administrava a propriedade e, como ele próprio admitiu, atendia as reivindicações pecuniárias do filho de modo irrepreensível e liberal. Mesmo assim, toda e qualquer conversa sobre assuntos de dinheiro entre os dois costumava acabar com as mais violentas reprimendas de sua parte, alegando que ela não o amava, que estava querendo economizar às suas custas e que provavelmente preferiria vê-lo morto a ter que deixá-lo assumir todo o controle sobre o dinheiro. A mãe costumava protestar, manifestando com lágrimas o seu desinteresse, e ele então ficava envergonhado de si mesmo e declarava que não pensava de fato nada disso a respeito dela. Entretanto, era certo que repetiria a mesma cena na primeira oportunidade. Quando estava com quatro anos e meio, durante o período de ansiedade, aconteceu ter sujado as calças durante o dia. Ficou terrivelmente envergonhado e, enquanto o limpavam, queixou-se de que não poderia continuar a viver daquele jeito. Certa vez, no início do período de ansiedade, aconteceu que a mãe, apreensiva, deu ordens para que se tomassem precauções para proteger as crianças de uma disenteria que aparecera nas imediações da granja. Entre o uso impudente que fez da sua incontinência, quanto tinha três anos e meio, e o horror com que a considerou, aos quatro anos e meio, está o sonho com o qual se iniciou o seu período de ansiedade — o sonho que lhe deu uma compreensão preterida da cena que testemunhara, com um ano e meio, e uma explicação do papel desempenhado pela mulher no ato sexual. É apenas outro passo para ligar a mudança da sua atitude em relação à defecação com essa mesma grande revulsão. Quando o sonho do Natal, com a sua excitação e expectativa, evocou diante dele o quadro da relação sexual dos pais, como fora antes observado (ou construído) por ele, não pode haver dúvida de que a primeira visão da cena a aflorar foi a antiga, de acordo com a qual a parte do corpo feminino que recebeu o órgão masculino era o ânus. Rejeitou o que era novo (no nosso caso, de motivos ligados com o seu medo da castração) e agarrou-se rapidamente ao que era velho. Decidiu-se a favor do intestino e contra a vagina, tal como, por motivos semelhantes, tomou depois o partido do pai contra Deus. Repudiou a nova informação e apegou-se à velha teoria. Esta última deve ter-lhe proporcionado o material para a sua identificação com as mulheres, que surgiu depois, como um pavor da morte em relação com os intestinos, bem como para os seus primeiros escrúpulos religiosos, quanto à questão de saber se Cristo havia tido um traseiro, e assim por diante.Num estádio posterior do desenvolvimento sexual, as fezes adquirem o significado de um bebê. Pois os bebês, como as fezes, nascem através do ânus. O significado de ‘dádiva’ das fezes admite prontamente essa transformação. É comum falar-se de um bebê como de uma ‘dádiva’. A expressão mais freqüente é a de que a mulher ‘deu’ ao homem um bebê; mas, no uso do inconsciente, é dada igual atenção justamente ao outro aspecto da relação, qual seja, ao fato de a mulher ter ‘recebido’ o bebê como uma dádiva do homem. O significado de fezes como dinheiro sai, em outra direção, do significado de ‘dádiva’. Suas pesquisas sexuais chegaram à compreensão, durante o curso do sonho, daquilo para que haviam sido preparadas para descobrir antes do sonho, ou seja, que o ato sexual resolvia o problema da origem dos bebês. Mesmo antes do sonho, ele já não gostava de bebês. Uma vez, ao encontrar um passarinho ainda sem penas que havia caído do ninho, confundiu-o com um bebê humano e ficou horrorizado. A análise demonstrou que todos os pequenos animais, tais como as lagartas e os insetos, aos quais tanto maltratara, haviam tido, para ele, o significado de bebês. Sua posição em relação à irmã mais velha dera-lhe todas as oportunidades para refletir sobre a relação entre crianças mais novas e crianças mais velhas. Às correntes sexuais que já são por nós conhecidas, devemos, portanto, acrescentar uma outra, a qual, como as demais, partiu da cena primária reproduzida no sonho. Na sua identificação com as mulheres (isto é, com sua mãe) estava pronto a dar ao pai um bebê, e sentia ciúmes da mãe, que já o havia feito e talvez o fizesse outra vez. Por via indireta, uma vez que tanto ‘dinheiro’ como ‘bebê’ têm o sentido de ‘dádiva’, o dinheiro pode assumir o significado de bebê e pode tornar-se, dessa maneira, o meio de expressar satisfação feminina (homossexual). Quando ele e a irmã estavam, na época, num sanatório alemão, viu o pai dar à irmã duas notas grandes.
Em sua imaginação, sempre houvera suspeitas quanto às relações do pai com a irmã, e, ao ver a cena, seu ciúme despertou. Correu para a irmã tão logo ficaram a sós e exigiu uma parte do dinheiro com tanta veemência e com tais acusações, que a irmã, aos prantos, atirou-lhe na cara todo o dinheiro. O que o havia excitado não era simplesmente o dinheiro em si, mas, antes, o ‘bebê’ — satisfação sexual anal obtida do pai. E ele conseguiu consolar-se com isso quando, com o pai ainda vivo, a irmã morreu. A idéia revoltante que lhe ocorreu quando soube a notícia da sua morte na verdade não significava mais do que isto: ‘Agora sou o único filho. Agora o Pai terá que amar a mais, somente.’ Embora essa reflexão fosse, em si, perfeitamente capaz de tornar-se consciente, seu fundo homossexual ainda assim era tão intolerável, que foi possível fazê-lo aflorar, dissimulado na forma da mais sórdida avareza, como um grande alívio. Também, de maneira semelhante, quando após a morte do pai ele censurava a mãe, injustificadamente, por querer enganá-lo com o dinheiro e por gostar mais do dinheiro do que dele. Os antigos ciúmes que sentia de sua mãe, por ter amado outra criança além dele, pela possibilidade de ter desejado outro filho depois dele, levaram-no a fazer acusações que ele próprio sabia serem injustificadas. No segundo desses significados, uma certa ternura feminina encontra expressão: uma disponibilidade para renunciar à própria masculinidade, se, em troca disso, se possa ser amado como uma mulher.
Temos aqui, então, precisamente o mesmo impulso para Deus, expressado, em palavras não ambíguas, no sistema delirante do paranóico Schreber. Uma alucinação que este mesmo paciente teve aos cinco anos de idade. “Quando eu tinha cinco anos, estava brincando no jardim perto da babá, fazendo cortes com meu canivete na casca de uma das nogueiras que aparecem em meu sonho também. De repente, para meu inexprimível terror, notei ter cortado fora o dedo mínimo da mão (direita ou esquerda?), de modo que ele se achava dependurado, preso apenas pela pele. Não senti dor, mas um grande medo. Não me atrevi a dizer nada à babá, que se encontrava a apenas alguns passos de distância, mas deixei-me cair sobre o assento mais próximo e lá fiquei sentado, incapaz de dirigir outro olhar ao meu dedo. Por fim, me acalmei, olhei para ele e vi que estava inteiramente ileso.” Depois de ter sido instruído com a história bíblica aos quatro anos, ele começou, como sabemos, a fazer o intenso esforço de pensamento que culminou com a sua piedade obsessiva. Podemos presumir, portanto, que essa alucinação pertence ao período no qual foi levado a reconhecer a realidade da castração e deve, talvez, ser considerada como o acontecimento que marca verdadeiramente esse passo. Mesmo a pequena correção feita pelo paciente não deixa de ter interesse.
Essa alucinação do dedo ferido foi instigada, conforme relatou mais tarde, pela história de uma conhecida sua, que havia nascido com seis dedos nos pés e tivera esse sexto dedo decepado, em cada pé, por um machado, imediatamente após o nascimento. As mulheres, então, não tinham pênis porque este lhes era cortado ao nascer. Quando analisei o seu cerimonial de respirar para fora sempre que via aleijados, mendigos e gente miserável, consegui mostrar que esse sintoma podia também remeter-se ao pai, a quem achou triste quando o visitou no sanatório. A análise tornou possível seguir essa trilha ainda mais remotamente. Num período muito precoce, provavelmente antes da sua sedução (com a idade de três anos e um quarto), estivera na granja um velho trabalhador diarista, cuja função era agora a de carregar água para a casa. Não podia falar, porque sua língua fora, ao que parece, cortada fora. (Era provavelmente um surdo-mudo.) O menino gostava muito desse velho e sentia uma profunda pena dele. Quando o velho morreu o menino procurou por ele no céu. Eis aí, então, o primeiro aleijado do qual se apiedou e, como foi mostrado pelo contexto e pelo ponto em que o episódio aflorou na análise, um indubitável substituto paterno.
Na análise esse homem foi associado com a recordação de outros servos de quem o paciente gostara e sobre os quais destacava o fato de que eram ou doentes ou judeus (o que implicava em circuncisão). Também o criado que o havia ajudado a limpar-se depois do seu acidente, aos quatro anos e meio, era judeu e tuberculoso, e fora igualmente objeto de sua compaixão. Todas essas figuras pertencem ao período anterior à visita que fez ao pai no sanatório, isto é, antes da formação do sintoma; este deve, portanto, ter tido antes o sentido de repelir (por meio da expiração) qualquer identificação com o objeto da piedade do paciente. Então, de repente, em conexão com um sonho, a análise imergiu outra vez no período pré-histórico e induziu-o a afirmar que durante a cópula, na cena primária, ele observara o pênis desaparecer, que sentira pena do pai por causa disso e que se alegrara com o reaparecimento daquilo que achara que estava perdido. Ali estava, portanto, um impulso emocional recente, partindo uma vez mais da cena primária. Ademais, a origem narcísica da compaixão (que é confirmada pela própria palavra) revela-se aqui de forma inequívoca.
Comentários de Freud
Na psicologia de adultos, atingimos felizmente o ponto de conseguir dividir os processos mentais em conscientes e inconscientes e de estarmos aptos a dar uma descrição clara de ambos. Com as crianças, essa distinção deixa-nos quase totalmente desamparados. Muitas vezes é embaraçoso decidir o que se escolheria denominar consciente e o que chamar de inconsciente. O distúrbio no apetite do “homem dos lobos” pode ser resultado de algum processo na esfera da sexualidade. Tenho sido levado a considerar como a primeira organização sexual reconhecível a assim chamada fase ‘oral’ ou ‘canibalesca’, durante a qual predomina ainda a ligação original entre a excitação sexual e o instinto nutritivo. A organização sádico-anal pode ser facilmente considerada como uma continuação e um desenvolvimento da oral. Sua excitação sexual simpática expressou-se pela ação de defecar, embora seja verdade que, nesse comportamento, deve-se distinguir também um elemento ativo. Lado a lado com o masoquismo que dominava os seus impulsos sexuais e que se expressava também em fantasias, persistia igualmente o sadismo, que era dirigido contra os pequenos animais. Suas pesquisas sexuais haviam começado a partir da sedução e diziam respeito, essencialmente, a dois problemas: a origem das crianças e a possibilidade de perder os genitais. Essas buscas entrelaçaram-se com as manifestações dos seus impulsos instituais e dirigiram a sua propensão sádica para os animaizinhos, que como que representavam os bebês. O que foi reprimido foi a atitude homossexual compreendida no sentido genital, atitude que se havia formado sob a influência desse reconhecimento da castração.
A repressão era, desse modo, um resultado da sua masculinidade. Insistir que a bissexualidade é a força motivadora que leva à repressão é assumir uma visão por demais estreita; ao passo que se afirmamos o mesmo do conflito entre o ego e as tendências sexuais (isto é, a libido) estaremos cobrindo todos os casos possíveis.
Pode-se dizer que a ansiedade que estava envolvida na formação dessas fobias era um medo da castração. Essa afirmação não implica em contradição do ponto de vista de que a ansiedade se originou da repressão da libido homossexual. Ambos os modos de expressão referem-se ao mesmo processo, ou seja: a retirada da libido, pelo ego, do impulso ansioso homossexual, tendo a libido, então, se convertido em ansiedade livre e, subseqüentemente, ligada a fobias. O primeiro método de afirmação simplesmente acrescenta o motivo pelo qual o ego foi ativado.Se examinarmos a questão mais de perto, veremos que a primeira doença do nosso paciente (deixando de lado o distúrbio no apetite) não se esgotou quando dela extraímos a fobia. Deve ser considerada como uma verdadeira fobia, que não mostra simplesmente sintomas de ansiedade, mas também fenômenos de conversão. Uma parte do impulso homossexual foi mantida pelo órgão a que esse impulso dizia respeito; a partir dessa época e igualmente durante a vida adulta, seu intestino comportou-se como um órgão histericamente afetado. O homossexualismo reprimido e inconsciente refugiou-se nos intestinos. Foi precisamente essa característica de histeria que foi de tão grande valia como auxílio ao esclarecimento da sua doença posterior. A religião funcionou nessa criança atormentada — pela combinação, que proporcionava ao crente, de satisfação, de sublimação, de desvio dos processos sensuais para os puramente espirituais e de acesso ao relacionamento social.

Durante o período de puberdade, surgiu no paciente uma corrente masculina, marcadamente sensual, com um propósito sexual próprio da organização genital; deve ser considerada normal e sua história ocupou todo o período que se estende até a doença posterior. Relacionava-se diretamente com a cena de Grusha, da qual tomou seu aspecto característico — uma paixão compulsiva que surgia e desaparecia, em acessos repentinos. Essa corrente teve de lutar contra as inibições que se originaram da sua neurose infantil. Houvera uma violenta mudança na direção das mulheres, e ele conquistara, dessa forma, uma masculinidade completa. A partir desse período, conservou as mulheres como seu objeto sexual; mas não desfrutava dessa posse, porquanto uma poderosa, e agora totalmente inconsciente, inclinação para os homens, na qual se uniam todas as forças das fases anteriores do seu desenvolvimento, afastava-o constantemente dos seus objetos femininos e compelia-o, nos intervalos, a exagerar sua dependência das mulheres. Esse o caso que está sendo exposto se distingue pela característica de que a neurose da vida adulta foi precedida por uma neurose nos primeiros anos da infância. Se alguém se sentir inclinado a recusá-lo porque a fobia animal não lhe parece suficientemente séria para ser reconhecida como uma neurose independente, devo dizer que a fobia foi sucedida, sem qualquer intervalo, por um cerimonial obsessivo, por atos e idéias obsessivos.A ocorrência de um distúrbio neurótico no quarto e no quinto ano da infância prova, antes de mais nada, que as experiências infantis são por si próprias capazes de produzir uma neurose, sem que haja necessidade de acrescentar-se a fuga de alguma tarefa a ser enfrentada na vida real.Só descobrimos, porém, impulsos instituais que a criança não consegue satisfazer, não tendo idade suficiente para dominá-los, e as fontes das quais se originam esses impulsos.


A Cópula entre Cães Pastores
Há, porém, outro fator que não é insubstituível e pode ser relegado. Talvez o que o menino observou não tenha sido uma cópula entre os pais, mas entre animais, que depois transferiu para os primeiros, como se tivesse deduzido que seus pais faziam as coisas do mesmo modo. Acima de tudo, o que dá cor a essa visão é o fato de que os lobos do sonho eram, na realidade, cães pastores e, além disso, aparecem como tais no desenho. Pouco antes do sonho, o menino foi levado repetidas vezes a visitar os rebanhos de ovelhas e lá pode ter visto justamente esses grandes cachorros brancos, e provavelmente também os viu copular. A transferência para os pais dos cães copulando não foi cumprida por meio de uma inferência acompanhada de palavras, mas por ter procurado em sua memória uma cena real, na qual os pais estivessem juntos e que pudesse coadunar-se com a situação da cópula. Todos os detalhes da cena que foram estabelecidos na análise do sonho puderam ser exatamente reproduzidos. Foi realmente numa tarde de verão, quando o menino estava sofrendo de malária, os pais estavam ambos presentes, vestidos de branco, que a criança despertou do seu sono, mas — a cena era inocente. O resto fora acrescentado pelo subseqüente desejo do menino curioso, baseado na sua experiência com os cães, para testemunhar também os pais fazendo amor; e a cena assim imaginada produziu então todos os efeitos que arrolamos, tal como se tivesse sido inteiramente real e não o resultado da fusão de dois componentes, um anterior e indiferente, o outro posterior e profundamente impressivo.
Pouco resta de estranho na conduta do menino ao fazer a transferência dos cães para os pais, e ao sentir medo do lobo, em vez de sentir medo do pai. A cena que seria inventada tinha que preencher determinadas condições que, em conseqüência das circunstâncias de vida do sonhador, só poderiam ser encontradas precisamente nesse período primitivo; tal era, por exemplo, a condição de que deveria estar na cama, no quarto dos pais. Os incidentes de observação de relações sexuais entre os pais em idade muito precoce (quer sejam verdadeiras lembranças, ou fantasias) não são, de fato, nenhuma raridade em análises de neuróticos. Possivelmente não são menos freqüentes entre aqueles que não são neuróticos. Possivelmente fazem parte do depósito regular — consciente ou inconsciente — de suas lembranças. Mas sempre que consegui desentranhar, por meio da análise, uma cena dessa natureza, ela mostrou a mesma peculiaridade, que nos surpreendeu, também, com o paciente em questão: relacionava-se com um coitus a tergo, o qual, por si, oferece ao espectador a possibilidade de examinar os genitais. Certamente não há mais necessidade de duvidar que estamos lidando apenas com uma fantasia, que nasceu talvez da observação de relações sexuais de animais. E mais ainda: sugeri que minha descrição da ‘cena primária’ ficou incompleta, porque reservei para um momento posterior o relato do modo pelo qual o menino interrompeu a relação entre os pais (teve um movimento intestinal repentino e começou a chorar). Devo acrescentar agora que essa forma de interrupção é sempre a mesma, em todos os casos. Este caso clínico ainda não chegou ao fim; no curso do seu desenvolvimento surgirá um fator que irá abalar a certeza de que parecemos desfrutar no momento.










Conclusão
O propósito deste trabalho foi aprofundar na relação das descobertas de Freud, interligando-as ao fracasso escolar como algo que vai além das notas baixas no boletim.
A criança em face inicial escolar (5 a 7 anos), está também passando por grandes elaborações psíquicas, como o Complexo de Édipo, o Complexo de Castração e o a formação do Ego e Superego.e sendo para muitas, uma face difícil de enfrentar. Sabiamente o inconsciente trabalha para aliviar essa elevada carga de ansiedade, refletidos em seu processo de escolarização. Mesmo estando na fase da latência, algumas crianças não conseguem passar por isso tão tranqüilamente, muitas vezes por pertencer a um meio familiar problemático (neurótico, histérico e até psicótico) e então as coisas se complicam. Na verdade a criança está pedindo socorro para o meio escolar.
A teoria psicanalítica pouco conhecida pelos educadores vem atribuir uma nova visão em relação aos sinais - sintomas apresentados por um aluno - criança. A teoria de Freud, juntamente com de Melaine Klein e de Anna Freud é muito valiosa, acredito eu, para àqueles que trabalham com reeducação psicopedagógica e distúrbios de aprendizagem. Acho imprescindível a leitura da análise de uma “História de uma Neurose Infantil” e dos conceitos básicos da teoria e da técnica freudiana, onde nos resulta reflexões que mudam nossa escuta e nosso modo de trabalhar.
A Psicanálise também é fantástica quando nos ensina a relação vivida pela criança entre fantasia e realidade no ato de brincar e nos contos de fada, dois pontos didáticos fortemente consideráveis na pedagogia atual.
Enfim, esta pesquisa e estudo foi de grande contribuição profissional. O bom mesmo seria se todos os educadores, tanto de crianças quanto de adultos, tivessem a oportunidade de conhecer a teoria do mestre Freud.

Bibliografia
BETTELHEIN, Bruno. A Psicanálise dos Contos de Fada. 17ª edição, Rio de Janeiro: Paz e Terra (1980)
CARVALHO, U. Psicanálise. Volumes I, II, III, IV e V. SPOB.
ETCHEGOYEN, H. Fundamentos da Técnica Psicanalítica. 2ª edição Artmed editora (1996)
FERNANDEZ, Alice. A inteligência aprisionada – abordagem psicopedagógica clínica da criança e sua família. Porto Alegre, Artes Médicas, (1990).
FERREIRO Emília. Reflexões sobre alfabetização. São Paulo, Cortez, (1986).
FREUD, A O Ego e os Mecanismos de Defesa. Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro (1972)
FREUD, S. Obras Completas. Em três tomos, editorial biblioteca Nueva. (1981)
GARCIA – ROSA, L. A Freud e o inconsciente. Jorge Zahar editor (2001)
GILBELLO, Bernard. A criança com distúrbios de inteligência. Porto Alegre, Artes Médicas, (1987).
GREENSON, R R. A técnica e a Prática da Psicanálise. Volume I. Imago editora (1967).
KAMII, Constance. A criança e o número. 4 ed. Campinas, Papirus, (1986).
KLEIN, M. Amor, Culpa e Reparação. Imago editora (1996)
KLEIN, M. Inveja e Gratidão. Imago editora (1991)
KUPFER, Maria C. Freud e a Educação, o mestre do impossível. São Paulo: Scipione (1989)
KUSNETZOFf. J C. Introdução à Psicopatologia Psicanalítica. Editora Nova Fronteira (1982)
LACAN, J, O Seminário – Livro7. A Ética da Psicanálise. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Editor (1988)
LAPLANCHE, J. Vocabulário da Psicanálise. Laplanche e pontalis; sob direção de Daniel Lagache; tradução Pedro Tamen. 4ª edição Martins Fontes (2001)
LOPES, Elaine M. T. A psicanálise escuta a educação. Belo Horizonte: Autêntica (1998)
MANNONI, Maud. A criança, sua “doença” e os outros. RJ. Zahar, (1985).
MILLOT, Catherine. Freud antipedagogo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor (1987)
NASIO, J. D. Como trabalha um Psicanalista? Jorge Zahar Editor ( 1999)
NASIO, J. D. Histeria - Teoria e Clínica Psicanalítica Jorge Zahar Editor ( 1982)TALLAFERRO, A Curso Básico de Psicanálise. M. Fontes editora (1996)
PIAGET, Jean. A construção do real na criança. 2 ed. RJ, (1975).
PIAGET, Jean. A psicologia da criança. SP, Difel, (1978).STEINER, J. Refúgios Psíquicos. Imago editora (1997)
RODRIGUES, Marlene. Psicologia Educacional: uma crônica do desenvolvimento humano. São Paulo, McGraw-hil do Brasil, (1976).
ROZA, E Santa. Quando brincar é dizer a experiência psicanalítica na infância. RJ, Relume Dumará, (1993).
SANDLER, J. Projeção, Identificação, Identificação Projetiva. Artes Médicas editora (1989)
SISTO, F.F Aprendizagem e mudanças cognitivas em crianças. Petrópolis, Vozes, (1997).
VISCA, Jorge. Clínica Psicopedagógica. Epistemologia Convergente. Porto Alegre, Artes médicas, (1987).
ZELAN, Karen. Os riscos do saber: Obstáculos do desenvolvimento á aprendizagem escolar. Porto Alegre, Artes médicas, (1993).
________, Inconsciente e destinos – Seminário de Psicanálise da criança. RJ, Jorge Zahar, (1989).

Nenhum comentário: